A DISTÂNCIA, AFINAL >> Eduardo Loureiro Jr.
"Eu sei e você sabe
que a distância não existe."
(Vinícius deMoraes)
"O amor não é amado."
(Francisco de Assis)
Veja você que situação a minha. Nesta crônica final sobre a distância, eu teria que dizer-lhe que a distância, afinal, não existe, que ela não passa de uma ilusão. Que as distâncias de que venho falando - física, mental, emocional, exterior e interior - são apenas miragens, sonhos sem realidade.
Mas, sendo a distância inexistente, que necessidade há que eu lhe diga isso? Pois se não há distância entre mim e você, o que eu penso é o que você pensa, o que eu sinto é o que você sente, e não haveria necessidade de comunicação.
Se eu insistir em lhe dizer da inexistência da distância, estarei, na prática, estabelecendo uma distância que estou negando na teoria: a distância será distanciada.
Mas posso lhe contar uma história, porque as histórias, mesmo sendo também ilusões, não têm a intenção de convencer, logo não perpetuam a ilusão, apenas deixam que a ilusão passe, se transforme, se dissolva...
*
Era uma vez um rei e uma rainha. Apaixonados. Mas seus reinos eram diferentes. No dele, havia já uma rainha. No dela, havia um outro rei. E quase nunca se encontravam sozinhos: havia sempre a rainha dele ou o rei dela presente. Quando, raramente, ficavam a sós, eram olharem-se intacta retina e de suas bocas, das quais estava proibido sair beijos, saíam palavras novas para eternas canções. Amavam-se sem se tocarem. Apaixonados.
Um dia, apareceu entre os reinos um homem fazendo-se passar por Deus. E convenceu a rainha de que não deveria amar o rei, mas o próprio homem-Deus. Querendo o amor da rainha, o homem-Deus pediu que ela não amasse. E a rainha, querendo ganhar o céu, aceitou não amar o rei e fingiu, até para si mesma, amar o homem-Deus.
Ao rei, que ela não poderia mais rever — por ordem do homem-Deus —, a rainha entregou um derradeiro presente, na forma de um livro que continha uma promessa disfarçada em título: "Longe é um lugar que não existe".
O rei não aceitou, em seu coração, a frase e achou que a forma mais clara de dizer que não a aceitava era não aceitando o livro na capa do qual a frase estava escrita. Mas uma coisa era a frase e outra coisa era o livro. Não aceitando o livro, que ficou na mão da rainha, ele aceitou, sem saber que havia aceito, a frase: longe é um lugar que não existe.
E só percebeu isso muito tempo depois, quando descobriu que cada vez que lembrava da rainha que nunca mais reviu, ele era feliz para sempre.
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