“LIMÃO GALEGO... RELOU TÁ PÊGO” [Maria Rita Lemos]


Quem passou dos trinta ou quarenta certamente se lembra que brincou de pega-pega. Bem como de “esconde-esconde”, “barra manteiga”... enfim, tanta coisa que as crianças de hoje, infelizmente, talvez nem tenham ouvido falar.

Pesquisadores de todo o mundo estão preocupados com essas mudanças radicais que as crianças sofreram nas últimas décadas, e já se sabe que correr, jogar bola, brincar de cobra cega e pular amarelinha é muito mais importante para a saúde física e mental de um ser em formação do que se poderia supor.

As crianças modernas brincam também, é claro, mas sua diversão, pelo menos nas classes mais favorecidas economicamente, é eletrônica na maioria das vezes. Sua alegria está, principalmente, na ponta dos dedos e no raciocínio. É como se o corpo, o tronco, as pernas ficassem esquecidos, parados, sem função.

No entanto, como o ser humano não muda assim tão depressa, nem física nem mentalmente, “crianças ainda precisam correr, se pendurar, se mexer, passar por cima e por baixo”, conforme diz o grande educador Içami Tiba. O que vivemos hoje é a perda de contato das crianças com a realidade, fruto do medo da violência na cidade grande. Violência esta que tirou as crianças das ruas e parques e prendeu-as em “playgrounds” e condomínios tão pequenos quanto monótonos.

Já está provado, cientificamente, que a criança que não administrou riscos, não tocou nem explorou o mundo, enfim, não correu nem experimentou o próprio corpo nos primeiros anos de vida, fica com prejuízos psicomotores que podem afetá-la a partir da fase da alfabetização. Basta lembrar que, do ponto de vista pedagógico, aprender a ler e a escrever requer pré-requisitos que são, principalmente, o senso de ritmo, lateralidade, orientação no espaço e tempo, equilíbrio e coordenação fina (de dedos). E esses pré-requisitos são obtidos, principalmente, nas brincadeiras livres da fase pré-escolar. Isto tudo sem falar no déficit emocional: brincar sozinha ou ficar muito tempo no computador ou no vídeo game, não ensina a criança a se relacionar com seus pares nem a administrar conflitos, o que pode ser muito ruim para sua vida futura.

Sabemos também que o problema é maior e mais antigo que a violência e a falta de espaço dos “apertamentos” das cidades grandes, que já não têm espaço nem quintal com árvores para subir e brincar. Há crianças que, mesmo dispondo deste espaço, quase não visitam seus quintais... Atrás disso encontramos famílias que ficam encantadas com a forma como suas crianças dominam os computadores e videogames, sem se lembrar de levá-las a um parque ou relembrar com elas antigas brincadeiras que nunca saem de moda.

A situação é tão séria que nem as próprias crianças modernas conseguem saber do que gostam, uma vez que não experimentaram outros tipos de diversão, a não ser as que espelham a pressão da mídia.

Apesar dessa realidade, nem tudo está perdido. O computador, a TV e o videogame estão aí e já fazem parte da nossa rotina, não podemos negar. Cabe aos pais, a partir disso, a tarefa mais difícil: selecionar a programação, interagir com os filhos, conversar sobre o que vêem e fazem juntos. Separar o joio do trigo – e, 365 dias por ano, ensinar os filhos e filhas a fazer isto sozinhos.

Imagem: Brincadeiras de Infância, Junião, Porto Alegre

Palavra de Mulher

Comentários

Anônimo disse…
Estou com 45. Tive uma infância maravilhosa e com o que você escreveu, lembrei de muita coisa vivida com meus 4 irmãos e não sei quantos primos, com e sem os meus pais por perto. Moro em apartamento, mas ainda bem que meus filhos têm casa de vô e fazenda de tio para curtir terra, bichos e árvores. Aproveitamos também a praia, piqueniques no parque do cocó, casas e ruas no Pacheco e passeios rápidos em Guaramiranga e Maranguape. Nossas crianças adoramos.

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