Amigo é pra essas coisas >> CRISTINA CARNEIRO
Eu não gosto de animais de estimação. Não, eles não diminuem a minha solidão. Sim, eu devo de ser egoísta para com seres que nem são da minha espécie.
Acontece que minha afetividade é proporcional à minha interação com o outro. Quanto mais, mais; quanto menos, menos: é assim que eu me prendo aos outros, ou então por sangue, ou desvairada obsessão.
Que tem uma exceção tem. Um amigo, que não bebe, não gosta se samba, não gosta de chuva, não gosta de mar. Toca piano ao invés de violão. Gosta de filme americano ao invés de iraniano. É extremamente benfeitor de tempestades em copo d'água. Tira a solidão cuidando de uma cachorrinha linda, de nome árabe: Zara.
Pois bem, somos amigos há dez anos. Amigos mesmo, dos bons. O que nos prende assim? A gente gosta muito de queijo. Tudo bem, não seria o suficiente, mas creiam que sim.
Outro dia, estava eu fazendo nada e resolvi o acompanhar numa das coisas que eu menos gosto de fazer e que ele, claro, adora: levantamento de preços de uma casinha para a Zara viajar de avião. Sim, fomos em cinco lojas, perguntamos preços, a melhor marca, as cores disponíveis. A diferença de preço de uma para outra era de R$ 1,00, R$ 2,00, mas ele não desistia. Eu o acompanhava meio no mundo da lua, só ouvindo as deliberações que ele fazia.
Depois do preço, a maior preocupação era a cor. Se comprasse azul, iam pensar que a cachorra era cachorro. Se comprasse rosa, iam duvidar da exata sexualidade dele. Arrematei: a coleira da cachorra era rosa e todo mundo continuava a perguntar se o bicho era macho ou fêmea. Pronto. Ele comprou a azul. Afinal, melhor prezar pela própria sexualidade.
Outro dia o encontrei inquieto. Queria comprar uma máquina de lavar e não sabia qual. Pesquisou preço em todas as maiores lojas do ramo, fez pesquisa profunda na internet sobre vantagens, desvantagens, tempo de lavagem, durabilidade, cor, tamanho, razão social, etc, etc, etc.
Um sábado desses fomos almoçar. A gente gosta de almoçar, além de gostar de queijo. Na saída, entramos numa loja. Trinta minutos de relógio. Ele viu todos os catálogos da loja, perguntou todas as impossíveis perguntas que existem para se fazer sobre uma máquina de lavar. Conversou com o vendedor, debateu com a gerente, faltou telefonar para o presidente da empresa. Por fim, resolveu, era aquela, bonita, de 9 quilos (só para uma pessoa!), aço inoxidável, lava com água quente, tira-manchas, desinfecta, ensaboa, desbota, seca, engoma, estende, grita, etc, etc, etc. Saiu feliz da vida.
Duas semanas depois, ele me convidou para comer fondue, de queijo, é claro. Ele estava cabisbaixo, borocoxô, triste mesmo. Perguntei o que era. Ele disse que a máquina de lavar, aquela que ele tinha passado semanas para escolher a melhor, o melhor preço, o melhor dia para ser instalada, pela qual ele tinha tirado o armário do banheiro, modificado a rotina do final de semana, não poderia ser comprada. Nem ela, nem qualquer outra máquina, nem a menor máquina de lavar já fabricada no Brasil.
Aconteceu de a porta do banheiro ser estreita demais.
Acontece que minha afetividade é proporcional à minha interação com o outro. Quanto mais, mais; quanto menos, menos: é assim que eu me prendo aos outros, ou então por sangue, ou desvairada obsessão.
Que tem uma exceção tem. Um amigo, que não bebe, não gosta se samba, não gosta de chuva, não gosta de mar. Toca piano ao invés de violão. Gosta de filme americano ao invés de iraniano. É extremamente benfeitor de tempestades em copo d'água. Tira a solidão cuidando de uma cachorrinha linda, de nome árabe: Zara.
Pois bem, somos amigos há dez anos. Amigos mesmo, dos bons. O que nos prende assim? A gente gosta muito de queijo. Tudo bem, não seria o suficiente, mas creiam que sim.
Outro dia, estava eu fazendo nada e resolvi o acompanhar numa das coisas que eu menos gosto de fazer e que ele, claro, adora: levantamento de preços de uma casinha para a Zara viajar de avião. Sim, fomos em cinco lojas, perguntamos preços, a melhor marca, as cores disponíveis. A diferença de preço de uma para outra era de R$ 1,00, R$ 2,00, mas ele não desistia. Eu o acompanhava meio no mundo da lua, só ouvindo as deliberações que ele fazia.
Depois do preço, a maior preocupação era a cor. Se comprasse azul, iam pensar que a cachorra era cachorro. Se comprasse rosa, iam duvidar da exata sexualidade dele. Arrematei: a coleira da cachorra era rosa e todo mundo continuava a perguntar se o bicho era macho ou fêmea. Pronto. Ele comprou a azul. Afinal, melhor prezar pela própria sexualidade.
Outro dia o encontrei inquieto. Queria comprar uma máquina de lavar e não sabia qual. Pesquisou preço em todas as maiores lojas do ramo, fez pesquisa profunda na internet sobre vantagens, desvantagens, tempo de lavagem, durabilidade, cor, tamanho, razão social, etc, etc, etc.
Um sábado desses fomos almoçar. A gente gosta de almoçar, além de gostar de queijo. Na saída, entramos numa loja. Trinta minutos de relógio. Ele viu todos os catálogos da loja, perguntou todas as impossíveis perguntas que existem para se fazer sobre uma máquina de lavar. Conversou com o vendedor, debateu com a gerente, faltou telefonar para o presidente da empresa. Por fim, resolveu, era aquela, bonita, de 9 quilos (só para uma pessoa!), aço inoxidável, lava com água quente, tira-manchas, desinfecta, ensaboa, desbota, seca, engoma, estende, grita, etc, etc, etc. Saiu feliz da vida.
Duas semanas depois, ele me convidou para comer fondue, de queijo, é claro. Ele estava cabisbaixo, borocoxô, triste mesmo. Perguntei o que era. Ele disse que a máquina de lavar, aquela que ele tinha passado semanas para escolher a melhor, o melhor preço, o melhor dia para ser instalada, pela qual ele tinha tirado o armário do banheiro, modificado a rotina do final de semana, não poderia ser comprada. Nem ela, nem qualquer outra máquina, nem a menor máquina de lavar já fabricada no Brasil.
Aconteceu de a porta do banheiro ser estreita demais.
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