ENCONTRO DE DESENCONTROS [Cris Ebecken]

Conheceram-se em tempo outro. Ela, marcada por mãos alheias, recém-separada de falsos sonhos bons. Ele, na fome de mãos novas, recém-separado de tentativas no vão. Para ele, encanto à primeira vista. Para ela, encanto a vistas seguintes. Na noite do início sem início, conversaram umas tantas, se sorriram, beijaram. Ele, sem dar brecha a quem conhecia, foi à frente atropelando, a oferecer mais presença, propondo continuidades ao par. Ela, com a desconfiança aprendida nas feridas em brasa, se assustou, precisou de dosagem. Seria ele mais um propondo engano? Que ilusões lhe vendia? Seria como os passados, depois de alvo de conquista, alvo de domínio? Escolheu pelo pé no freio, valorizando ainda assim a existência dele, preferiu no tempo deixar apenas as prosas afetuosas, o compartilhar das histórias. Deixou a ele o espaço da escolha da não tanta intimidade ou não, do conhecer sem pressa.
Audaz, topou a empreitada. Esbarraram-se pela cidade, trocaram vozes em telefonemas, olhares em encontros. Na medida do se conhecerem, ela foi aprendendo a olhá-lo como chegava, como era, descobrindo beleza na particularidade. Em um dia de sol inteiro, pensou ela ter cometido antes um engano, percebeu estar ele desatando todos seus medos, encontrava bem-estar no estar ali ao seu lado. Avaliou-se, apostou se dar uma nova chance, abriu as mãos deixando ir embora suas histórias mortas, e com as mesmas mãos foi abrir-lhe janelas e porta. Na noite anterior ao bilhete, sem dar atenção à abertura, ele se confessou desesperado na solidão, pediu que lhe apresentasse alguém. Ela se confessou espantada com a capacidade dos desencontros, se expôs.
Dessa vez, foi dele a preferência apenas pelas prosas afetuosas, ficando a ela a escolha a não tanta intimidade ou não. Embora não mais um conhecer sem pressa, acabava de tornar-se conhecido o suficiente sobre ambos. Assim ficaram pelo caminho. Ela e Ele. Ele e Ela. Dois na busca tragante do encontro. Cada um em si, no mútuo dos desencontros. E um senhor de longas barbas brancas, rindo e chorando tiquetaqueado, acima de todos, ecoando pelas páginas das datas: ai, esses humanos...
Foto da própria autora
Impressões, Canela de Verso e Prosa, Sonhos do Mundo
Comentários
Sim, ela precisa de um traumatologista... Todos nós já precisamos um dia.
Alíás todas nós ja fomos Ela um dia não?
Talvez por isso eu tenha amado...
Bjs
Ana