QUANDO FALTA... >> Carla Dias >>
Reinventar-se, nesse momento, não é somente questão de escolha. Trata-se também de uma necessidade. Pena que ficou muito mais complicado, não é?
Não se preocupe, porque não estou aqui para falar sobre reinventar-se. Isso eu já fiz, há alguns anos, em modo prosa-poética-de-ficção-escancarada. Se você quiser, pode conferir ali >> [Reinventar-se].
Não vou escrever sobre o que me incomoda profundamente nesse momento. Há muita gente fazendo isso, com mais coerência do que eu jamais terei. Talvez a minha reinvenção seja essa: calar minha escrita, diante dos absurdos da nossa realidade. Mas sinto dizer, aos que ficaram demasiado empolgados com o meu calar, que ele vai durar somente essa crônica. Sou péssima caladora de incômodos e escrever é a minha necessidade indomável. Contudo, fico muito feliz em saber que cada um de nós tem a liberdade de não ler o que não apetece, de não concordar com o que ofende, de não defender o que prejudica o outro. E sim, não interessa se nunca encontramos esse outro, seja lá em qual cenário da vida. Ele é o seu outro, como você é o outro dele. Também escrevi sobre isso... Chegue lá, clicando ali >> [Somos o outro um do outro].
Na verdade, não sei o que escrever. Também não é a primeira vez que essa incapacidade vem à baila. Continuo a achar os textos sobre não saber o que escrever deveras interessantes, porque dizem muito sobre o que falta.
Posso contar que organizei as gavetas dos diretórios do meu computador, que ao menos nele eu consigo me encontrar. É fantástico encontrar o que se procura, não? E quem se procura, porque esquecemos o quanto da nossa própria história guardamos nas nossas máquinas.
São tantas histórias que acabaram debaixo do tapete da vida.
Tenho estudado coisas diversas, que constarão no meu currículo como lembretes impetuosos sobre quem eu poderia ser e não me tornei... Quem eu fui, mas desisti de ser... Quem pensaram que eu fosse, mas nunca se deram ao trabalho de conferir.
Sempre gostei de estudar, descobrir, desvendar. Embora não seja muito prática no aproveitamento do material, posso dizer que quem eu poderia ser e não me tornei, quem fui, mas desisti de ser e quem pensaram que eu fosse, mas não se deram trabalho de conferir, todas elas concordam que há dias em que não há sabedoria que dê conta de solucionar a questão.
Mas não irei debulhar sobre ser, em tempos em que temos de ser entre quatro paredes, as 24 horas do dia. Bom, antes mesmo da quarentena, mas muito antes, eu já escrevi sobre isso. Se a curiosidade não estiver preguiçosa... ali >> [A mulher no sofá].
Posso contar que aquela árvore na calçada de 2016 está bem diferente em 2020. Ah, elas crescem e ficam altas, não? Que nesse capcioso ano, já assisti a auspiciosos pores do sol. Tomei sol na janela. Tomei chuva. Engoli desejo de dar uma volta pelas ruas do bairro. Plantei abóbora em um vasinho no qual ela não caberá, daqui a pouco. Tive taquicardia ao perceber que os incensos estão acabando.
Aprendi, pela nem sei qual vez, que a ideia de que a vida é fácil, delícia tipo drops de limão, é uma imensa bobagem. Ela é complicada, temperamental, repleta de pontos de virada que não escolhemos, e de incontáveis fins. Um deles eu até esbocei... Ali >> [Minuto de silêncio]. Às vezes, a vida é mandona, adora nos mostrar como erramos a mão, ao lidarmos com aquele assunto sensível. Aprendi que é justamente por a vida ser indomável, e que por assim ser, ela cabe em nós de forma surpreendente, que há dias que melhor é se calar.
Aprendi que há finalidade fundamental em corações partidos...
Tão ali >> [Sem destinatário].
Imagem © Margaret Macdonald Mackintosh
carladias.com
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