Vésperas >> Maria Rachel Oliveira

Hoje é véspera de Natal. O Natal é uma data cristã – uma vez que diz respeito, teoricamente, à celebração do aniversário do nascimento de Jesus de Nazaré, lá em Belém. Há ainda, na definição desta data, resquícios de celebrações pagãs, como o solstício de inverno no hemisfério norte – que é quando a parte iluminada do dia começa a ganhar mais espaço em cada 24h. Mas não voltei a este querido espaço pra falar de Natal, que Zoraya já falou tão bem ontem. Hoje, aqui, nós vamos falar de vésperas.

Segundo o dicionário, o significado mais difundido para véspera é “um dia que antecede imediatamente a outro determinado”. E, pensem cá comigo, quantas coisas antecipamos! Contamos os meses praquela viagem há tanto sonhada, os dias pra aquele encontro, as horas pra um telefonema... os segundos até às 18h de uma sexta-feira! Enquanto umas trazem consigo o cheiro do tender assando no forno, outras vêm com a preocupação da depilação ou da barba em dia ou mesmo opiniões pré-concebidas acerca do local escolhido pro happy hour. Antecipar coisas é normal. Descobrir, de antemão, como é o tempo em Quixeramobim das Couves na época em que passaremos as férias lá - pra podermos arrumar a mala adequadamente a fim de não sermos pegos de surpresa quando chegarmos.

Engraçado é que vésperas têm, em comum, todas elas - e na maioria dos casos -, mais pano pras mangas do que as datas que esperamos, propriamente ditas. Tudo culpa da nossa fértil imaginação! Aquele presente que esperávamos estrear no dia 31 vem com o tamanho errado ou simplesmente nada tem a ver conosco. O sorriso largo daquele filho chega meio torto porque ele já tinha mudado de ideia quanto ao seu presente de Natal e avisou pro Papai Noel que ele encontrou no shopping - mas não lembrou de falar isso pra gente! E aquele encontro? “Não deu, ela tinha um bafo horroroso!” ou “Nunca uma noite demorou tanto a passar!”. E agora, José? Isso quer dizer que todas as vésperas são melhores do que o evento aguardado?

Não, não foi exatamente isso que eu quis dizer. Eu quero dizer é o seguinte: antecipar acontecimentos é a forma mais certa que temos de nos decepcionar com nossa imaginação! E isso vale tanto para o bem quanto para o mal. Aquele encontro pelo qual não daríamos nada não tem como dar certo se já escrevermos de véspera seu script. Aliás, nem aquele outro encontro, super-hiper-ultra promissor, há de sair como a gente imaginou – porque não vai ser, certo como dois e dois são quatro. Nada acontece e-xa-ta-men-te como antecipamos; isso só seria possível caso pertencêssemos a uma espécie de seres-oráculo que desconhecem a existência de Murphy, do livre-arbítrio – como se isso fosse possível - e do inesperado.

O inesperado, esse sim, que pode ser uma das melhores coisas que existem.

Então, abracemos a antecipação. Curtir antes é bom! Mas que possamos sempre lembrar de soltar nossa imaginação com parcimônia nas vésperas; em cada uma delas. Que saibamos cuidar do nosso poder de antecipação feito pipa. Que voe, mas que não vá longe. Desviemos dos postes altos, dos fios telefônicos. Que consigamos manter o controle da linha para que não alcance o infinito azul do céu. Assim, não vamos permitir que a surpresa passe escondida por trás de alguma coisa que não saiu exatamente como a gente imaginou.

Que venha o novo. Tão novo que nem a nossa imaginação foi capaz de nos mostrar como seria.

Comentários

albir disse…
Esta véspera virou festa com a sua presença aqui. Que em 2012 você possa voltar muitas vezes para deleite de seus leitores. E alunos. Beijo, Rachel.
Zoraya disse…
Puxa, Rachel, e que seu 2012 também venha luzindo de novo, e tão lindo, que ultrapasse a imaginação. E, como o Albir, mais que sua aluna, quero ser sua leitora (aliás, que orgulho eu senti em você me citar no seu texto, uau!)
r a c h e l disse…
Ah, vocês são uns fofos. Ainda tenho que pegar o jeito. Sabe como é... casa de ferreiro... espeto de pau! Tô bem enferrujada ainda, mas hei de melhorar! Obrigada pelo carinho de sempre e um 2012 ótimo pra todo o mundo desse cantinho tão querido!

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