A SAGA DO CASÓRIO >> Sílvia Tibo
Casar sempre esteve nos meus planos, ainda que eu nunca tenha me preocupado em estabelecer uma época exata pra que isso acontecesse. Acredito realmente que a vida pode ser muito mais intensa e divertida quando temos alguém com quem dividir nossos projetos e partilhar nossas experiências.
Mas organizar o tal do evento não é brincadeira. Para as noivas mais exigentes e detalhistas, a tarefa pode mesmo se tornar um martírio.
Não me refiro, propriamente, à busca por buffet, decorador, músicos e outros mimos e detalhes que geralmente se fazem presentes em um evento dessa natureza. Tudo isso é gostoso, por menor que seja o orçamento dos noivos. Dá trabalho, sem dúvida, mas a energia despendida não é maior do que a satisfação que é sentida ao ver tudo acontecendo da maneira como se planejou.
O problema é, na verdade, a encenação que existe por trás de tudo isso.
A dificuldade começa já no momento em que o casal decide se unir formalmente, não só aos olhos da lei, mas também sob a bênção divina, com direito a cerimônia religiosa, vestido de noiva, marcha nupcial, cortejo de padrinhos, damas de honra e chuva de arroz.
Geralmente, começa-se definindo o local da cerimônia. Inicia-se, então, a corrida desesperada às igrejas, católicas ou não, em busca de uma vaguinha pra daqui a um ou dois anos. Em alguns locais, é tão difícil conseguir a tão sonhada vaga que se torna necessário defini-la (e garanti-la) já no início do namoro. Se não der certo? Termina-se o relacionamento e desiste-se da data, o que é melhor e mais fácil do que consegui-la depois, em cima da hora.
Embora boa parte dos noivos e noivas não frequente qualquer desses templos religiosos com assiduidade e, muitas vezes, não professem religião alguma, a união acaba acontecendo em um desses locais, porque assim é desde que o mundo é mundo e, portanto, é assim que tem que ser.
Seguindo todo o protocolo, o garoto e a garota, vestidos a caráter, adentram, um de cada vez, aquele templo sagrado, em meio aos olhares (em grande parte críticos e curiosos) do batalhão de convidados, em direção ao celebrante, que praticamente os constrange a proferir aquelas tradicionais promessas de amor, respeito e fidelidade “por todos os dias de suas vidas, até que a morte os separe”. Ao final, o famigerado “sim”, das duas partes, fecha com chave de ouro a celebração.
É claro que há noivos que proferem o juramento (e o “sim”) com consciência da importância e da gravidade daquilo que estão dizendo. E que o fazem, também, de coração aberto, com o desejo e a expectativa de que a promessa se concretize e, sobretudo, com a disposição de contribuir para que isso aconteça. Mas também há aquele grupinho de nubentes que repete as palavras do padre sem sequer se dar conta do que está dizendo. Fala aquilo que tem que ser dito e pronto. Simplesmente porque é o que todo mundo espera e é o que todo mundo faz.
Fico sonhando com o dia em que os padres concederão aos noivos a oportunidade de dizerem um para o outro exatamente aquilo que desejam, com suas próprias palavras, sem grandes formalidades e ensaios. Sonho, ainda, com o dia em que as promessas sejam de amor enquanto houver felicidade recíproca e de fidelidade enquanto for possível e enquanto estiverem bem juntos. O respeito, esse sim, deve existir sempre entre os seres humanos, qualquer que seja o caso.
Dando continuidade à saga do casório, escolhida a igreja para a realização do enlace, passe-se à procura do vestido de noiva. A cor? Branca, claro. E longo, com direito a um véu igualmente comprido e no mesmo tom. O noivo também deve estar elegante, afinal, a ocasião é solene.
A trilha sonora? Deve ser sacra e clássica, ao menos em sua maioria. Afinal, onde é que já se viu um casamento sem “tam tam tam tam” e Ave Maria de Bach?
Definidas as canções que embalarão o evento, é hora de escolher os detalhes da festa, a começar pelo cardápio. E é claro que as comidinhas precisam estar à altura de toda essa sofisticação. Coxinhas de frango com catupiry são mais gostosas do que canapés de mussarela de búfala, como todo mundo sabe, mas, na hora “h”, são facilmente excluídas do menu e substituídas pela segunda opção, muito mais chique e requintada.
As flores e os arranjos que ornamentarão o evento devem ser igualmente nobres. De preferência, em tons clássicos, exatamente como manda o figurino. Cores, assim como as coxinhas, ficam para outra ocasião, pois não cabem em um casamento.
Por fim, a tal da valsa. Ou do tango. Ou do forró. Ou do que quer que seja. Afinal, a entrada dos noivos deve ser triunfal. E ai deles se não presentearem os convidados com uma dança qualquer. E pobre da noiva, ainda, se não jogar o buquê ao final, depois de algumas ameaças, para causar suspense nas solteirinhas de plantão.
Sei que minhas observações sobre o casamento são um tanto críticas e, talvez, até um pouco debochadas. Mas é chegado o momento de me redimir e dizer que nada tenho contra qualquer das escolhas mencionadas. O que não suporto e não aceito é a imposição que existe em torno da maioria delas.
Assisti a casamentos de amigas muito queridas ao longo dos últimos anos. Quase todas elas se casaram na igreja, repetindo as palavras do padre, vestidas de branco, com véu e juras de amor eterno. Confesso que me emocionei ao vê-las ali, no altar, cumprindo todos os protocolos, exatamente como suas mães e avós fizeram. E me alegrei, também, ao ver o quanto tudo aquilo era importante e significativo para elas.
Cheguei, então, ao ponto em que eu desejava. Mais uma vez, nada tenho contra as tradições e os rituais que envolvem a realização de um casamento, desde que essas tradições e esses rituais estejam em consonância com aquilo que os noivos são e pensam. O que não dá é para obrigar um ateu a se casar dentro da igreja. Ou para forçar a noiva que odeia branco a se vestir dessa cor. Ou, ainda, para constranger alguém que mal consegue mexer o corpo a ensaiar passos, apresentando-se como o pé de valsa que, na verdade, nunca foi.
Comentários
Não desisto de tentar viver de acordo com aquilo que penso e sinto, a despeito dos olhares e das críticas alheias...
Sigamos por este caminho, não é?
Grande abraço!
Que bom receber sua visita aqui!
Pois é, o casório envolve uma infinidade de detalhes, despesas e preocupações, não é?
Mas também penso que tudo isso vale a pena, desde que nada seja feito para agradar apenas aos desejos e olhares alheios.
Sucesso pra você também nos preparativos, viu?
Beijo!
Mas dá pra encontrar sim, com um pouco de paciência, não é?
Obrigada pelos comentários, sempre tão carinhosos...
Grande abraço!
Gostei da sua reflexão!
Beijos
Casamento em dose dupla, né? Rs.
Também tenho procurado fugir aos modelos... Vamos ver até onde consigo... Rs.
Obrigada pela leitura!
Grande beijo!
Beijinhos...