AMOR [Debora Bottcher]
Nietzsche dizia que, quando alguém decide se casar, a pergunta mais importante que deveria se fazer é: "Terei prazer em conversar com essa pessoa quando eu for velho?"
Junho chegou e trouxe a tiracolo a data comercial do amor: o Dia dos Namorados. Não se ouve falar de outra coisa (além do ministro Palocci, obviamente): TV's e revistas estampam vitrines de lingeries, perfumes, bombons e flores, num convite a demonstrações financeiras do sentimento supremo. Mas, ainda que seja muito bom dar e ganhar presentes, será que são realmente indispensáveis para o amor? E numa data específica?
Depois de uma certa idade — e não exatamente avançada — você conclui que experiência não se transmite. E quando se trata de relações afetivas, essa percepção fica ainda mais evidente. Não dá, por exemplo, para dizer para alguém apaixonado que 'um amor e uma cabana' são coisas de romance — livro, filme e novela — e que, quando a realidade vem com contas a pagar e filhos pra criar, se a base for só a paixão avassaladora dos dois primeiros anos de delícias, seu sonho de amor está fadado ao fracasso.
Também não é viável ponderar sobre coisas que só quem está de fora é capaz de enxergar. Por exemplo: o namorado da sua amiga bebe um pouco mais que o razoável; a namorada do seu irmão é ciumenta acima do normal — até pra você ela 'rosna'; o novo namorado da sua colega de faculdade tem ares de playboy e desaparece demais... Mas quem vai arriscar dizer qualquer coisa contra aquele bonitão grosseiro que com um 'vem cá, meu bem' faz a amiga esquecer tudo o que ele aprontou, dissipando defeitos ou contratempos? Como é que se vai abordar um irmão, se quando a moça chega cheia de chamego — e decotes — ele nem lembra que tem família?
Tem várias coisas que passam despercebidas a olhares românticos, mas que fazem diferença quando a relação começa a ficar mais estreita. E quando isso acontece, a ilusão se desfaz e os 'detalhes' caem sobre os apaixonados como um raio de desencanto. O sofrimento fica inevitável e, não raro, sela-se o pacto de nunca mais amar... Até que um novo ciclo de amor recomeça — do mesmo jeito...
Mas tudo seria mais fácil se a gente olhasse para o outro — eleito/a — com um olhar menos emocional, desde o início, mesmo quando a gente tenta convencer — a si e aos outros — que a coisa é passageira. Se ponderasse sobre futuro, responsabilidades, objetivos comuns, carreira, filhos, casa própria, família, velhice — os assuntos sérios que a gente esquece (nem lembra!) quando está apaixonado —, muitas frustrações poderiam ser evitadas.
Alguém pode alegar que, se assim fosse, o encanto desapareceria antes de começar. Mas também haveria menos dor e desilusão — 'verbos' que não combinam com a felicidade desejada, nem no início nem no fim.
Se fosse possível ter um olhar mais objetivo sobre o amor logo que ele nos flecha, haveria menos abandono e separação, menos silêncio e solidão (inclusive entre os pares), mais alegria genuína e paz de espírito. Nada de atitudes passionais: dias mais calmos e amor de verdade, tanto e mais — até que a morte os separe.
E muito mais conversa - em todas as fases da vida a dois...
Junho chegou e trouxe a tiracolo a data comercial do amor: o Dia dos Namorados. Não se ouve falar de outra coisa (além do ministro Palocci, obviamente): TV's e revistas estampam vitrines de lingeries, perfumes, bombons e flores, num convite a demonstrações financeiras do sentimento supremo. Mas, ainda que seja muito bom dar e ganhar presentes, será que são realmente indispensáveis para o amor? E numa data específica?
Depois de uma certa idade — e não exatamente avançada — você conclui que experiência não se transmite. E quando se trata de relações afetivas, essa percepção fica ainda mais evidente. Não dá, por exemplo, para dizer para alguém apaixonado que 'um amor e uma cabana' são coisas de romance — livro, filme e novela — e que, quando a realidade vem com contas a pagar e filhos pra criar, se a base for só a paixão avassaladora dos dois primeiros anos de delícias, seu sonho de amor está fadado ao fracasso.
Também não é viável ponderar sobre coisas que só quem está de fora é capaz de enxergar. Por exemplo: o namorado da sua amiga bebe um pouco mais que o razoável; a namorada do seu irmão é ciumenta acima do normal — até pra você ela 'rosna'; o novo namorado da sua colega de faculdade tem ares de playboy e desaparece demais... Mas quem vai arriscar dizer qualquer coisa contra aquele bonitão grosseiro que com um 'vem cá, meu bem' faz a amiga esquecer tudo o que ele aprontou, dissipando defeitos ou contratempos? Como é que se vai abordar um irmão, se quando a moça chega cheia de chamego — e decotes — ele nem lembra que tem família?
Tem várias coisas que passam despercebidas a olhares românticos, mas que fazem diferença quando a relação começa a ficar mais estreita. E quando isso acontece, a ilusão se desfaz e os 'detalhes' caem sobre os apaixonados como um raio de desencanto. O sofrimento fica inevitável e, não raro, sela-se o pacto de nunca mais amar... Até que um novo ciclo de amor recomeça — do mesmo jeito...
Mas tudo seria mais fácil se a gente olhasse para o outro — eleito/a — com um olhar menos emocional, desde o início, mesmo quando a gente tenta convencer — a si e aos outros — que a coisa é passageira. Se ponderasse sobre futuro, responsabilidades, objetivos comuns, carreira, filhos, casa própria, família, velhice — os assuntos sérios que a gente esquece (nem lembra!) quando está apaixonado —, muitas frustrações poderiam ser evitadas.
Alguém pode alegar que, se assim fosse, o encanto desapareceria antes de começar. Mas também haveria menos dor e desilusão — 'verbos' que não combinam com a felicidade desejada, nem no início nem no fim.
Se fosse possível ter um olhar mais objetivo sobre o amor logo que ele nos flecha, haveria menos abandono e separação, menos silêncio e solidão (inclusive entre os pares), mais alegria genuína e paz de espírito. Nada de atitudes passionais: dias mais calmos e amor de verdade, tanto e mais — até que a morte os separe.
E muito mais conversa - em todas as fases da vida a dois...
Comentários
Se amar fosse simples assim como ficariam a poesia e o romance?
Lucidez versus paixão, duas coisas que não combinam na estrada rumo ao amor. Um texto bem escrito, lúcido, porém difícil de ser aplicado quando o desvario nos toma de assalto. Bjs
bjs
Risos... Efeito colateral da paixão é surdez... e quando a criatura é surda normalmente - a comentários lúcidos - quando apaixonada fica pior.
Se ao menos as pessoas ouvissem...
Beijo grande
Beijo todos.