CONFORTO [Carla Cintia Conteiro]
Sempre lembro daquela discussão do Seinfeld com o George sobre a adequação de usar agasalhos de ginástica no dia-a-dia. George argumentava que eram muito confortáveis. Seinfeld dizia que não serviam justamente por isso. Passavam a ideia de que para aquela pessoa não restava nada além do conforto. O conforto como a última barreira antes do nada absoluto. Em programas de TV que fazem transformação no visual das pessoas, as moças e senhoras que serão salvas da ruína estética sempre defendem seu estilo inicial como confortável. Não é raro que os apresentadores se referiram àqueles trapos como “I gave up” dress (vestido “desisti”) ou “I have no sex” suit (conjunto “eu não transo”).
Leio sobre o Avatar blues, a depressão pós-Avatar. Algumas pessoas vão assistir ao filme e voltam para casa arrasadas, porque jamais verão ou viverão coisas como aquelas mostradas na fita. E eu penso sobre o que essas pessoas andam fazendo das próprias vidas, com quem se relacionam, aonde vão, com o que preenchem seu tempo de passagem por esta Terra. Certamente não são criaturas ricas em seu íntimo. Devem estar comodamente vestidas ou despidas em seus acolhedores casulos domésticos, entupindo-se com sua comfort food.
A tentação do conforto é grande. Quase tanto quanto suas melancólicas contra-indicações. Sentir-se confortável numa roupa deselegante, num emprego desestimulante, que paga mal, mas é seguro, num casamento morno, numa vida medíocre é meio caminho andado para a infelicidade. Para ser feliz, o ser humano precisa ter seus neurônios desafiados, seus sentidos estimulados, sua curiosidade atiçada. Parar em algum ponto e achar que ali está bom é péssimo. Quem não pedala, cai da bicicleta. Ou desce a ladeira de ré. Carpe diem, portanto.
Conheço pessoas exaustas que são incapazes de dizer o que fizeram entre o momento que abriram os olhos pela manhã e o instante em que se recolhem confortavelmente à noite. Estão vivendo no piloto automático, todos os dias iguais. Vão aos mesmos lugares, encontram as mesmas pessoas, falam sobre os mesmos assuntos, comem as mesmas refeições e assistem aos mesmos programas na TV. Sentem-se miseravelmente infelizes e nem sabem direito por que ou o que as incomoda. Derretem-se na flacidez da alma. Culpam filhos, pais, cônjuges ou toda a humanidade por não lhe darem carinho, apoio e atenção, quando quem lhes está faltando com amor são elas próprias. Que interesse é esse que querem suscitar se não se fazem interessantes?
Ao receber sua estatueta, na cerimônia do Oscar, o diretor de efeitos visuais de Avatar disse: "O que nós fizemos com Avatar foi pegar coisas que estão aí fora no mundo o tempo todo e torná-las maiores, mais brilhantes. Toda nossa inspiração veio do mundo real, e eu queria encorajar as pessoas a saírem e olharem para essas coisas".
Pode ser que tudo o que se precise seja perceber a vida por si mesmo, experimentando com os próprios sentidos e não através do filtro da Internet, da TV, dos jornais e revistas. Deixar um pouco de lado o luxuriante sofá, a poltrona que já se amoldou a curvas corporais cada vez mais roliças, a cadeira com apoio para os braços, rodinhas e encosto para a cabeça. Abrir a janela. Sair porta afora. Esquecer o carro em casa e liberar a atenção para observar a paisagem, as pessoas, o que acontece em volta. Descobrir um corpo com músculos e uma mente viva, que pensa sozinha e tira suas próprias conclusões. Abandonar a languidez passiva. Dispensar o conforto diário e arriscar umas bolhas nos pés, uns calos nas mãos, uns sustos, umas lágrimas diante de um milagre cotidiano, uns lampejos de inspiração...
Desconfortar-se, desconformar-se, por fim, ser!
Leio sobre o Avatar blues, a depressão pós-Avatar. Algumas pessoas vão assistir ao filme e voltam para casa arrasadas, porque jamais verão ou viverão coisas como aquelas mostradas na fita. E eu penso sobre o que essas pessoas andam fazendo das próprias vidas, com quem se relacionam, aonde vão, com o que preenchem seu tempo de passagem por esta Terra. Certamente não são criaturas ricas em seu íntimo. Devem estar comodamente vestidas ou despidas em seus acolhedores casulos domésticos, entupindo-se com sua comfort food.
A tentação do conforto é grande. Quase tanto quanto suas melancólicas contra-indicações. Sentir-se confortável numa roupa deselegante, num emprego desestimulante, que paga mal, mas é seguro, num casamento morno, numa vida medíocre é meio caminho andado para a infelicidade. Para ser feliz, o ser humano precisa ter seus neurônios desafiados, seus sentidos estimulados, sua curiosidade atiçada. Parar em algum ponto e achar que ali está bom é péssimo. Quem não pedala, cai da bicicleta. Ou desce a ladeira de ré. Carpe diem, portanto.
Conheço pessoas exaustas que são incapazes de dizer o que fizeram entre o momento que abriram os olhos pela manhã e o instante em que se recolhem confortavelmente à noite. Estão vivendo no piloto automático, todos os dias iguais. Vão aos mesmos lugares, encontram as mesmas pessoas, falam sobre os mesmos assuntos, comem as mesmas refeições e assistem aos mesmos programas na TV. Sentem-se miseravelmente infelizes e nem sabem direito por que ou o que as incomoda. Derretem-se na flacidez da alma. Culpam filhos, pais, cônjuges ou toda a humanidade por não lhe darem carinho, apoio e atenção, quando quem lhes está faltando com amor são elas próprias. Que interesse é esse que querem suscitar se não se fazem interessantes?
Ao receber sua estatueta, na cerimônia do Oscar, o diretor de efeitos visuais de Avatar disse: "O que nós fizemos com Avatar foi pegar coisas que estão aí fora no mundo o tempo todo e torná-las maiores, mais brilhantes. Toda nossa inspiração veio do mundo real, e eu queria encorajar as pessoas a saírem e olharem para essas coisas".
Pode ser que tudo o que se precise seja perceber a vida por si mesmo, experimentando com os próprios sentidos e não através do filtro da Internet, da TV, dos jornais e revistas. Deixar um pouco de lado o luxuriante sofá, a poltrona que já se amoldou a curvas corporais cada vez mais roliças, a cadeira com apoio para os braços, rodinhas e encosto para a cabeça. Abrir a janela. Sair porta afora. Esquecer o carro em casa e liberar a atenção para observar a paisagem, as pessoas, o que acontece em volta. Descobrir um corpo com músculos e uma mente viva, que pensa sozinha e tira suas próprias conclusões. Abandonar a languidez passiva. Dispensar o conforto diário e arriscar umas bolhas nos pés, uns calos nas mãos, uns sustos, umas lágrimas diante de um milagre cotidiano, uns lampejos de inspiração...
Desconfortar-se, desconformar-se, por fim, ser!
Comentários
Bom final de semana.
"Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses. [meu verso favorito deste poema]
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam."
Ricardo Reis, um dos heterônimos de Fernando Pessoa (1888-1935)
O Eduardo é muito caprichoso com este espaço. É uma das minhas esquinas favoritas da Internet também.
beijo,
Carla Cintia
Pessoa é sempre adequado, em todos os momentos. Ter feito você se lembrar dele é uma honra para mim.
Agradecida.
beijo,
Carla Cintia