Dá licença? Posso entrar? >> Claudia Letti

Chego acompanhada da sensação de atraso que tentei deixar ali no hall de entrada. Não é exatamente uma sensação desconfortável mas, de todo modo, sempre fico com a impressão que perdi o melhor da festa, embora minha taça de champagne esteja gelada e borbulhante. Champagne, não mais coca-cola. Em algum momento nesses dez anos, depois de escrever aqui, no Crônica do Dia, categoricamente um "Obrigada, eu não bebo", aprendi a bebericar espumantes. Dez anos é muito tempo pra pretender que a vida permaneça inalterada e muito pouco pra alterar tudo que se gostaria.
Há dez anos me mudei para o Rio, que me acolheu com a calorosidade dos seus 40 graus. Cheguei aqui apaixonada pela cidade e pelo amor chiado e gingado que ela me oferecia. Se não me engano, minha primeira crônica para o Crônica do Dia falava do meu espanto pela cidade grande e pelo fascínio que ela causava no meu, até então, cotidiano provinciano. Uma década parece ser tempo o bastante pra extrair do amor um amigo e amar de novo -- com outro sotaque. Dez anos é tempo suficiente pra aprender uma cidade ou se perder nela.
Nesses dez anos, minha filha se transformou numa mulher enquanto eu ainda aprendo, todo santo dia, a ser menina. Ganhei três enteados, um deles já é um homem, dois ainda serão, no máximo, em dez anos. Alguns sonhos ganharam asas tão grandes que se perderam no imenso azul das expectativas e estão a voar tão alto que, duvido, aterrissem um dia. Outros, fiz questão de construir pistas largas e de comprimento confortável para que chegassem ao seu destino, que nem sempre ou necessariamente era até a mim. E alguns poucos sonhos, ainda cultivo com cuidado, como quem se agarra ao fio frágil de uma pipa colorida, deixando que voe solta, apenas pra não dar chance ao desencantamento.
Há dez anos (ou mais?) conheci pessoalmente algumas das muitas Artemísias, amigas que me acompanham desde então, inclusive aqui neste espaço. Durante esses dez anos fui a Fortaleza conhecer Eduardo (e Julia também!) e o abracei com o carinho de amigos de infância. Fiz amigos novos e continuei cultivando amigos de décadas. E se perdi alguns afetos foi por conta da reciclagem nata da vida que aproxima ou afasta caminhos à nossa revelia, mas -- como nada é por acaso -- guarda o sentido dos desencontros em seu código secreto.
Nunca fui muito amiga da permanência nem das retrospectivas, mas posso afirmar que dentre as muitas mudanças a que me atrevi e que a vida promoveu nestes dez anos, poucas coisas se mantêm e mantenho com frescor e alegria: os amigos, escrever para o Crônica do Dia e exercitar a inconstância -- esta última talvez seja a responsável pela sensação de estar sempre chegando atrasada. Vai ver é por isso mesmo que, em várias situações da vida, eu me adiante por medo de ser tomada por decisões tardias. O que, definitivamente, não é o caso aqui e agora, vide meu atraso de quase um mês para a festa dos dez anos. Me desculpo e me conforto com uma boa dose de indulgência: afinal o que são alguns dias diante de uma década? E depois, sei que vocês hão de concordar comigo: festa boa é a que não tem hora pra acabar...
A propósito, ninguém vai abrir outra garrafa de champagne?
Comentários
Beijos
D.
Hoje, em especial, fiquei mais emocionada. Senti uma identificação tão grande, tão grande...
Obrigada pelo presente de poder te ler e me emocionar e me fazer [re]pensar.
Beijo e carinho,
Beijão!
De qualquer jeito, um brinde à sua volta, com espumante, com coca-cola e a certeza de que mais sonhos irão se apresentar ao longo do caminho!
Bisous querida, welcome back! (Muita saudade de te ler, mesmo!)
Que felicidade te ler. Sinto tanta falta das tuas letras, do teu texto sempre preciso e leve. Obrigada pela lembraça!
boas coisas pra ti,
beijo grande,
Vai escrever bem assim lá na... Quer dizer, vem escrever bem assim aqui no Crônica do Dia toda semana. Tudo bem, de quinze em quinze dias. Só não deixe essa festa acabar. Deixe ela durar para sempre. :)
Mas, preciso concordar com você, a Claudia escreve mais que bemmmmm. Ainda bem que é aqui em casa.
Essa é a minha amiga de sempre ....Beijo para os doisssssssss
tim...tim...
clau, a britto
Lady Kill, quase não te reconheço nesse "avatar", não fosse pelo email e o D da assinatura. Que bom que você, a que testa meus humores em texto, gostou tanto assim. :)
Margarida, que saudade docê, menina. Acho que a nossa "troca", nossa amizade, tem muito de identificação mesmo, e por isso você gosta dos meus textos tanto quanto eu gosto de você!
Fausto meu amigo querido, querido demais, daqui ha 10 anos a gente conversa, quem sabe até lá trocaremos nossos cafés - aliás...quando? - por um bom espumante!?
Rachel, acho que foi por conta dos nossos atrasos que nos encontramos. Nada é por acaso, mesmo! Obrigada pelo seu carinho sempre presente! :)
Ana, quando você diz que sente minha falta, seja pela presença ou pelas letras, eu fico contente, você sabe. Tenho saudade das tuas também, guria.
Eduardo, pára de beber menino, sai dessa vida!! Ou começa de uma vez pra gente bebemorar a crônica e seus 10, 11, 12... muitos anos, bebemorar a vida, a amizade da gente que eu gosto demais. Vou escrever, pelo menos de 15 em 15 dias -- palavra de bandeirante!! (ainda existe isso?)
Marisa, que bom que eu tive o privilégio do seu comentário. Eu sempre leio você por aqui e já tenho carinho pelo carinho que você tem pela gente. Obrigada, viu!?
Clau, e a gente que se conhece, não ha 10 mas ha 30 anos!? Que crônica daria isso tudo, hein!? Uia! :)
beijo quase em mel...
clau...sempre britto
Beijos
Adorei : )
Beijos
Mônica...
Parabéns pra você, para o Crônicas e pra nós, seus amigos, que temos o privilégio de conhecer você e ler seus ótimos textos.
Beijo grande e muitas e muitas décadas de sucesso e amizade!
"Dez anos é muito tempo pra pretender que a vida permaneça inalterada e muito pouco pra alterar tudo que se gostaria." Achei perfeita essa frase, e vou guardar no meu diário, para não esquecer...
Beijos doces cristalizados!!! :o*
a moça dos textos cheios de alma.
Estou sempre te lendo em silêncio, compondo um grupo de amigos que comentam entre si as coisas que vc escreve. Desta vez teu afeto me inspirou e despertou para meus próprios escritos. E eu quero te agradecer por isso!
Se puder, passe rapidinho no meu blog e veja o que vc fez... rsrs...
Grande abraço!
Clarisse.
E o tempo é nossa vida, que é difícil, transforma-se, é bonita. Muda muito, tanto que às vezes dói, ou às vezes dá somente uma melancolia.
Mas quando olhamos para trás, é sempre assim: válido, leve, sempre digno de champanha (como tantos endossaram).
Agora um comentário mais técnico: tu sabes se pôr na situação, no sentido de a usar como uma onda e surfar nela.
Como na crônica do problema. Isso lhe dá uma habilidade especial para escrever crônicas.