PISE NA GRAMA >> Fernanda Pinho



Quando cheguei em Santiago pela primeira vez, umas das diferenças que observei de cara foi que as pessoas pisavam na grama. Das praças, dos parques, dos canteiros. Sem pudor, sem constrangimentos, sem o comportamento suspeito de quem está sendo vigiado ou fazendo alguma coisa errada.
- Aqui as pessoas pisam na grama? - Perguntei, inocentemente surpresa.
- Claro! - Foi a resposta que ouvi junto com um olhar de "que pergunta louca é essa? Isso não é óbvio?".
Não. Não é óbvio para mim que, no Brasil, me acostumei às repressivas e antipáticas placas de "Não pise na grama". 

Continuei a observar com admiração e até uma certa inveja aquelas pessoas que não pisam na grama para cortar um caminho, enquanto não tem ninguém olhando, mas que usufruem da grama descaradamente. Tiram um cochilo, fazem meditação, dormem, leem, jogam conversa fora. Ali, na grama. Como também acontece em Londres, Paris e outras cidades onde as autoridades não estão muito atentas a esses meliantes pisadores de grama.

Minha admiração por essa permissividade de Santiago só aumentou quando, essa semana, li no Facebook o relato de um advogado que juntamente com um amigo foram presos em Belo Horizonte, por terem pisado na grama. Não eram baderneiros, não estavam drogados nem alcoolizados, não ofereceram resistência, não ameaçavam a segurança pública. Mas isso não vem ao caso. Não quero falar de arbitrariedades, nem de inocentes e culpados. Quero falar das plaquinhas proibitivas que, de fato, estão espalhadas por toda Belo Horizonte e não fazem nada além de atrapalhar a estética dos jardins e criar uma repressão sem sentido. As cidades já estão cada vez mais inóspitas, ainda nos privam do contato com o pouco de verde que sobra. Por um motivo tão, tão, qual é o motivo mesmo?

Pensemos bem. O objetivo é preservar a grama e deixá-la mais bonita? Se for, a intenção é boa, mas a estratégia é péssima. Trocar as plaquinhas por crianças correndo atrás de balões, casais apaixonados, senhorinhas sendo puxada por seus poodles, jovens praticando slackline, traria uma beleza muito menos plástica e muito mais real. Uma beleza como a da Praça do Papa, a mais linda de Belo Horizonte e - adivinhem só! - um dos poucos espaços públicos da cidade onde não existe essa proibição esdrúxula.

Eu, se grama fosse, ia preferir mil vezes o contato humano a uma estaca no meu peito.


Comentários

Preciso ler tudo o que está em atraso! Por isso vou correr pisando na grama até o texto da semana passada :) Te amo!
Patrícia disse…
É bem verdade!! Moro em Belo Horizonte, e ai que raiva que dá essas plaquinhas! E pra quê!!?!?! Tão mais natural pisar na grama, deitar na grama, se espreguiçar mesmoo!! Amei o texto. Abraços!
Paula irmã disse…
Sem dúvida alguma é preferível largar a grama de lado e dar idéia a outros problemas públicos.
Quero ser uma "meliante" kkkkkkkkk... Pisemos na grama!!!
Zoraya disse…
O negócio é que nossas "otoridades" nao querem se dar ao trabalho de cuidar dos espaços públicos. Pise bastante na grama por nós, Fernanda.

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