APAIXONADA MA NON TROPPO>>Zoraya Cesar
Ela tinha quase 70 anos, era gorda, mal cuidada. Não por falta de dinheiro, ao contrário, era viúva rica. Apenas não era vaidosa. Bem, dizer que não era vaidosa é uma inverdade. Odete era relaxada mesmo. Não fazia a mínima questão de se cuidar, nunca fizera um exercício na vida e jamais passara um creme no rosto sequer.
As roupas? Caríssimas, compradas nas lojas mais elegantes. Porém de um mau gosto atroz. Se Odete fosse homem, poderíamos dizer que ela se vestia como um bicheiro gordo. Mas ela é uma mulher, e é muito importante para nossa história que não esqueçamos disso, portanto, não vamos falar em bicheiros. Nem em gordos (até porque esse fato realmente não é tão fundamental assim, é só para dar uma ideia da figura de Odete ao amigo leitor)
Como resultado de seu desleixo estético, era chamada de “tribufu” pelas costas (inclusive pelo próprio o marido, uma baixaria). Odete se cuidava mal mas tinha uma saúde de ferro. Ferro, alumínio, zinco, tudo estava em ordem (e o marido, que era quase psicótico em termos de saúde, morreu antes dela. Coisas da vida).
Agora, vamos à vida social de Odete. Por ser rica, amigas não lhe faltavam, nem clubes ou compras. Mas não sejamos tão cínicos, Odete tinha duas amigas verdadeiras, que estavam com ela por amizade, e não por interesse ou obrigação social. É a pura verdade, foi uma delas quem me contou tudo.
Assim que o marido morreu, Odete decidiu que era tempo de se divertir, afinal, o chato passava os dias trancados em casa, não saía com ela para fazer nada, vivia resmungando. Sim, pensou Odete, vou me divertir.
E dá-lhe de viajar, sair, comprar. Porém Odete continuava insatisfeita. Algo lhe faltava. E uma noite, jantando sozinha no Massimus, um dos restaurantes mais caros da cidade (não me pergunte qual cidade, não sou rica que nem a Odete, não freqüentamos os mesmos círculos), ela percebeu qual o problema.
Faltava-lhe companhia. Masculina.
Precisava encontrar um homem que estivesse disposto a ficar com ela, em todos os sentidos. Não entenderam? Tentarei explicar sem perder a elegância. Havia anos incontáveis que Odete e o falecido Augusto não tinham conjunções carnais. Nem de qualquer outro tipo, a bem da verdade. E Odete, pode-se dizer o que for dela, jamais traíra o marido, mesmo quando, um pouco mais jovem, ainda abrasava-se com os desejos da carne insatisfeita.
Pois os calores do desejo voltaram a percorrer seu corpo, e ela não estava nem um pouco disposta a sufocá-los novamente. Restava-lhe, portanto, resolver a equação: idosa + feia + gorda. E, enquanto pagava a conta do jantar, chegou à solução. Rica. Ela era rica. Podia ter o homem que quisesse. Bastava apenas querer o homem certo.
Começou a procurar em anúncios de jornal por rapazes de programa. Não joguem pedras nem critiquem. Eu mesma não estou julgando Odete, apenas contando a história. Aliás, vamos à história.
Odete saiu com vários, mas nunca levou nenhum para casa, era sempre em motéis de luxo. Que ela pagava, claro. Assim como os jantares e extras.
Um dia encontrou um rapaz que a agradou mais que os anteriores. E foi com ele que Odete fez um acordo de exclusividade, pelo qual ele ficaria disponível a qualquer momento que ela chamasse para jantar, ir ao cinema, fazer compras ou... vocês sabem, ter relações íntimas (com direito a tudo, tudo mesmo, inclusive beijo na boca). E em vez de pagar por programa, Odete lhe daria um salário.
Ela sempre achara Paris entediante, mas era o sonho dele, então, lá foram eles. Ele gostava de dirigir; ela comprou um carro para ele levá-la aos motéis e lugares. Jantavam apenas em locais discretos e luxuosos, e, para isso, era necessário que o rapaz se vestisse de acordo. Foram a Nova Iorque comprar roupas para ele.
Uma noite, porém, em pleno colóquio carnal, num quarto cercado por espelhos no teto, nas paredes, até o chão era meio espelhado, no auge, no clímax do ato libidinoso, ele grita “eu te amo”.
Pequena pausa, silêncio profundo.
PLAFT.
A mão pesada de Odete deixou a marca de seus dedos na cara do rapaz, que, aturdido e machucado (o tapa doeu!), pulou da cama, cambaleante.
- Tá pensando que sou burra? Pensa que eu não me enxergo? Você ama é o meu dinheiro, isso sim. E você está dispensado. Vai voltar para seu trabalho de go-go boy.
E Odete contava o caso às gargalhadas, nem um pouco constrangida. Dizia que não tinha ilusões românticas e nem queria homens da sua idade. “Quem gosta de velho é cadeira de balanço”, repetia. Ela só queria se divertir, afirmava. E voltou a olhar os classificados, para espanto daquelas duas amigas.
A mim, acho que nada mais espanta. E a vocês?
Comentários
Dá- lhe Odete!! Nada como uma mulher segura de si!
Zoraya, agora escreve a história desse rapaz, que deve andar por aí cheio de traumas e pensando onde foi que errou.
Beijos.
se eu ainda me espantava, suas histórias estão me ajudando a ficar livre de espantos. Beijos.
Abraços!