INVEJA DE MIM >> Fernanda Pinho
"Esse primeiro palpitar da seiva, essa revelação da consciência a si própria, nunca mais me esqueceu, nem achei que lhe fosse comparável qualquer outra sensação da mesma espécie. Naturalmente por ser minha. Naturalmente por ser a primeira". [Dom Casmurro]
No primeiro dia de aula de alguma série do primário, notei que o Diego não estava mais na minha sala. E o pior: ele sequer continuava no colégio. Desolação total. Qual seria minha motivação para as aulas de Educação Física? Para quem eu iria me produzir? Quem eu iria ficar encarando quando estivéssemos em círculo para a aula de religião? O nome de quem eu escreveria no meu caderno? O do Diego, é claro. Se era para resolver a questão, resolvi de forma prática. Quando a professora fez a chamada e eu notei que havia um novo Diego na sala, decidi. "Tudo bem, vou gostar desse aí agora". Porque no fim, o que me interessa não eram os Diegos (nem os Brunos, Pedros e Tiagos), mas a sensação que eles despertavam.
Hoje em dia não há nada na minha vida que me lembre, nem de longe, essa sensação. Mas a recuperei em minha memória ao ler o livro "Minha Vida Fora de Série", da Paula Pimenta (essa mesma, que escrevia aqui no blog). O livro fala sobre o cotidiano de uma menina de 13 anos que, em determinado ponto da história, traça uma verdadeira tática de guerra para conseguir fazer um trabalho em dupla com o menino por quem ela é apaixonada. Tudo para que ela tenha a chance de encostar seu braço no dele. Encostar o braço no dele. Só isso.
Porque esses amores adolescentes são assim. Intensos porque qualquer toque acidental já é o auge daquele relacionamento. Efêmeros e fugazes porque se o amado já não lhe parece tão bonito, é só eleger outro. Desde que o outro te provoque as mesmas sensações. E é tão fácil que isso aconteça. Fácil porque quando somos adolescentes, estamos no auge da nossa sabedoria, e não caímos nessa burrice adulta de esperar muita coisa do outro.
Não é preciso ligar nem mandar flores no dia seguinte ao esbarrão. Não é preciso se falar todos os dias. Não é preciso saber a data do aniversário um do outro. Não é preciso nem ir ao aniversário um do outro. Não é preciso se ver no fim de semana (Pra quê? Se tem a escola todo dia). Não é preciso fazer planos para o futuro (no máximo criar uma estratégia para descobrir o nome completo do outro). Não é preciso envolver a família. Não é preciso investimento emocional nem financeiro. Só é preciso existir. E quando, ao ler o livro da Paula, eu me lembrei que amar é assim, quase morri de inveja da minha versão de 15 anos atrás.
Comentários
Você escreve muitíssimo bem!
Cheguei a sentir saudades da menina que fui.
Beijo!