ALICE >> Carla Dias >>

Quando estava na escola, eu tinha uma professora de Educação Artística que se chamava Alice, e ela fazia milagres. Ela era tão diferente das pessoas que eu conhecia que, às vezes, o meu olhar e os meus ouvidos se perdiam nela. Para mim, ela sabia fazer mágica, também, porque em uma escola desfalcada de material para se lecionar, ela aparecia sempre com alguma novidade que nos deixava pra lá de felizes.

Além de aprender que arco-íris era coisa séria para alimentar a alma, a professora Alice tentou também nos ensinar um pouquinho de música. Foi difícil, porque não tínhamos equipamentos apropriados, então não conseguíamos passar dos poucos tambores e das flautas de brinquedo.

Houve um baile na escola, com direito ao tradicional correio-elegante, que ela tentou aprimorar, já que o Dia das Bruxas estava logo ali, e ela queria que aprendêssemos como esse dia nasceu. No meio do pátio, ela montou um tipo de tenda, e sem se importar com o fato de, há muito tempo, já a chamarem de bruxa, por causa da sua fisionomia peculiar, vestiu-se da própria e deu de assustar os casaizinhos que dançavam e ler a sorte deles nos seus olhares esbugalhados.

Foi divertido para quem estava sem par...

Se naquela época a palavra bullying fosse a vedete que é hoje, eu diria que a professora Alice sofria um bullying lascado por parte de alguns alunos. Justamente porque era muito diferente, porque alguns passaram mesmo a acreditar que ela era uma bruxa, já que ninguém podia conceber alguém tão diferente, tão feliz, tão alto astral, que acreditava em uma escola tão carente, inclusive de alunos interessados em aprender.

Quem quer aprender cores? Pra quê?

Quem quer bater em tamborzinhos e assoprar em flautinhas? Pra quê?

Particularmente, a fisionomia peculiar da professora Alice me parecia de uma lindeza sem fim. Nos traços fortes do seu rosto, estampava-se a coragem de alguém ciente de que ensinar em um ambiente tão árido é um tiro no escuro e uma entrega temperada com ousadia. Então, ela aguentava a indiferença de muitos alunos, e sempre tentando trazê-los para perto, assim como os esgares de professores que achavam que a arte não fazia parte da arte de ensinar pessoas, de formar indivíduos.

Naquela época, no começo dos anos oitenta, não tínhamos o que temos hoje... Hoje todos nós podemos ver o mundo numa amplidão jamais sonhada, que apenas aconteceu. E a arte, neste agora, tem sido ferramenta importante no resgate de muitos. Projetos culturais fazem o papel de mentores na educação, porque, com a arte, despertam o interesse de muitos por ela e por outras áreas também.

Porém, não estou aqui para enganar ninguém com o meu entusiasmo. Sei que há muitas escolas como a minha, naquele passado, pelo Brasil afora. Assim como há muitas Alices brigando pelo futuro dos seus alunos, em qualquer área, desprovidas do apoio que deveriam ter para construir um país mais capaz.

Lembrei-me da minha professora Alice após ler um artigo sobre a inclusão da música nas escolas. Pensei que será muito importante que os alunos, ao terem contato com a música, percebam a importância que ela tem para o nosso repertório existencial. E tudo bem se despertarem músicos talentosos que também se tornarão advogados. Ou médicos essenciais às suas especialidades que sejam ótimos pianistas.

O que nós, os brasileiros, temos de compreender é que a arte em geral é essencial, que ela humaniza. Temos de celebrá-la como fazemos com qualquer formação profissional. Músico, artista plástico, escritor, escultor... A arte tem de ser cuidada no mesmo tom do valor que designamos aos outros cursos. E então, se já nascem artistas fantásticos no nosso país, ainda que desprovidos dessa educação respeitosa, imaginem o que podemos presenciar se a eles oferecermos as ferramentas para que sobrevivam de sua arte, e orgulhem-se e sejam admirados por ela.

Não sei por onde anda a professora Alice e seus cabelos psicodélicos, seu sorriso desavergonhado, seu desejo de mostrar que é bom aprender. Mas espero que todos possam ter a oportunidade de conhecer uma Alice, porque há um valor imenso em se aprender com pessoas como ela.

E porque a vida vai além das cores primárias.

carladias.com

Comentários

Carla, é por essas e outras alices que o Brasil ainda será o país das maravilhas. :)
Unknown disse…
Que penas que os professores não são somente Alices, muito menos os alunos são Carlas. O mundo seria tão melhor...
Carla Dias disse…
Eduardo... Acredito muito nisso, de coração.

Fernanda... O mundo será tão melhor, viu? Apesar das Alices e das Carlas, e principalmente pelas Fernandas.
Carla, seu texto me fez voltar também aos meus tempos de escola com os grandes heróis da minha infância.
Obrigada por mais esta emoção.

Bjs
O PREÇO DO EGOÍSMO



Um longo período de estiagem na floresta, já estava deixando todos os animais quase sem comida, até o animal mais feroz, o leão, já não achava mais comida tão fácil assim, acostumado com muita caça e carne à vontade, mas desta vez a natureza estava sendo rigorosa demais com os animais daquele lugar a muito tempo não chovia.
Aos poucos nas lagoas estavam sobrando pequenas poças e muita lama, até peixes estavam escassos.
Um dia, o leão saiu desesperado para caçar, percorreu toda a mata a procura de veados, corsas, cervos ou porcos do mato, mas nada estava ao seu alcance, parecia que todos esses animais teriam desaparecido. Em outros tempos, o rei da floresta dormia boa parte do dia e quando sentia fome, em poucas horas e sem muito esforço já tinha em suas garras comida em abundancia, tanto que os chacais e hienas não precisavam caçar, pois comiam os restos generosos que sobrava de sua caçada. Mas naquele dia ele já estava cansado e nem uma lebre aparecia para que ele matasse sua fome. O imponente animal já estava a quilômetros de sua cova e resolveu voltar, mas num golpe de sorte no caminho de volta para seu espaço da floresta, avistou um javali que comia verme em um tronco podre, o pobre animal que também estava tentando matar sua fome, desatento se tornou presa fácil ao feroz leão que se aproximou subitamente e sem dó nem piedade abocanhou o javali que instantaneamente se tornou o prato do dia daquela fera!
Então o leão estando mais próximo de sua cova resolveu levar sua caça e come-la em seu cantinho preferido e guardar os restos para outro dia de fome, pois o tempo de abundancia já era.
Enquanto arrastava o javali, deixava para traz marcas de sangue do animal, de forma que despertava o faro aguçado de outros animais que viviam esperando para comer restos deixados por grandes caçadores.
Quando o leão estava passando próximo de uma lagoa viu um leão com um javali na boca, ele não percebia que era sua imagem refletida no espelho d água, logo imaginou que se tomasse a carne do outro leão, teria fartura por alguns dias. Assim ele deixou sua caça na beira da lagoa e se jogou naquela poça que era mais lama do que água. De repente ele caiu em si e voltando para fora da lagoa avistou ao longe que os chacais haviam roubado sua caça e cansado por ter se debatido dentro da lama, não tinha mais forças para correr atrás de sua comida!
Olhando novamente para a poça d’água ele se viu só que agora não tinha mais nada em sua boca, estava todo sujo e muito cansado, deixou escapar o que levou o dia inteiro para conquistar por conta do seu egoísmo. Tinha garantido comida para uns dois ou três dias e agora estava de novo com fome e refletiu:
Em tempos de escassez, ele quis ter mais e perdeu o que já tinha. Viu o que não era verdade e acreditou numa ilusão. Era imponente, porem por seu egoísmo e ganância se tornara impotente. Quis ser implacável e fez papel de tolo.
Aprendeu que egoísmo e ganância não somam nada a sua vida, mas sim diminuem e te torna fraco, te jogam na lama, te faz sujo e sem perspectivas de um futuro de triunfos!

Você é assim, egoísta, ganancioso e tolo?


AUTOR: JOSÉ VENUTO
www.venutoimpactodp.blogspot.com
Zoraya disse…
Carla, que linda crônica! Pessoas que reconhecem que a vida vai muito além das cores primárias são a razão de viver das Alices desse mundo. Tenho certeza, pelo que você escreve, que Alice nao passou por sua vida em vão. Que você tenha sempre uma caixa de Caran d'ache à mão. Beijos
Carla Dias disse…
Marisa... É bom quando reencontramos esses heróis nas nossas lembranças, não? Beijo!

Zoraya... Obrigada pelo comentário tão gentil. A Alice fez sim uma diferença enorme na minha vida. Acredito que, por este motivo, ela estará sempre na minha memória. Beijo pra você.
Adriel Duarte disse…
Felizmente, agente se depara com esse texto repleto de impressões pessoais da autora mas de que certa forma nos remete as nossas particularidades enquanto alunos que um dia fomos. Eu tinha uma Alice na escola ela se Chamava Carme Célia. E tenho muita saudades dela.

Ótimo texto.
Carla Dias disse…
Adriel... Isso mesmo, todos nós temos, independente de quando e por quanto tempo, um professor que nos inspire. Obrigada pela leitura! Abraço!

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