NASCEDOURO >> Carla Dias >>

Não buscamos cicatrizes, veja bem... Queremos mais é que não haja corte. Então, que tal fazer a corte a essa paz que não tem rótulo como este que foi grudado na cara da gente?
Porque quando se nasce cuspido, sabe? Caindo em qualquer canto da vida e lambuzando-se de abandonos. Quando se nasce assim, logo nos cravam as tachas nas mãos e crucificam nosso futuro. Mas não queremos pular nossa infância. Queremos mesmo é celebrá-la até que, na idade adulta, nesse futuro mais catártico do que brincante, nós possamos sorrir sem as fendas que nos causaram as tristezas pirracentas. Entende o que digo?
Espalharam por aí e por milênios, que é preciso doer o diabo para compreender a lição. Carecemos mesmo do dolente aprendizado? Dia outro, uma menina aí até que se permitiu fascinar pelo sorriso de um menino e, veja só!... Não doeu nada e ela aprendeu o afeto. E apesar da compreensão sobre sermos distraídos quando embalados pela felicidade, queremos mesmo sangrar alegrias?

Você me ensinou a duvidar da sorte; nascedouro do “deixa estar pra ver como é que fica”. Eu que nasci às avessas, comprometida com as profundezas dos sentimentos, devo-lhe o exorcismo de um rótulo e outro; de um abismo e outro. Devo-lhe a identidade do meu desejo, não de ficar em cima do muro ou socá-lo até ferir as mãos... E sim o de me reinventar com asas. E o mais tocante disso tudo é que não precisou muito. Bastou que acreditasse na minha existência; que me chamasse pelo nome. Que escutasse o que eu tinha a dizer.
Quando se nasce assim...

Imagens: Banco de imagens
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Comentários
que maravilha, cronista! muito obrigada.
Belíssima crônica!