COTOVELOS >> Sergio Geia
Algo preocupante me ocorreu nesta manhã. Saí de casa para o trabalho, apertei o botão do elevador, entrei. A cabeça estava na segunda-feira, na semana que começava, nesta roda gigante que é a vida. De repente, meu olhar pousou no canto do espelho, na imagem que refletia um homem sonolento. Nesse momento vi, e a visão fez meu mundo cair: velhos; meus cotovelos estão velhos.
Talvez você não tenha compreendido (ainda) a dimensão dessa simples constatação. Pode achá-la tola, e você está no seu direito. Mas me dê uma chance de explicá-la, quem sabe você me dê razão.
Os sinais da velhice são ocultados de diversas formas: cabelos brancos, por exemplo, recebem tinta; vincos da face, cremes. Você até elimina esses vincos; pode remodelar o tamanho dos lábios, afinar nariz, clarear dentes e alinhá-los, pode perder peso, fabricar músculos, espetar um brinco na orelha, desenhar um dragão no ombro, pode o diabo a quatro para manter a juventude que teima em partir.
Pode usar calça apertada, camisa de mangas longas por fora da calça; pode vestir botas, sapatênis, blazer com jeans. Pode usar boné ao contrário, falar gírias, mudar o vocabulário.
No entanto, quando seus cotovelos começam a desandar, e uma carninha mole e enrugada aparece, esqueça. A marca, como um carimbo, estará lá, pra quem quiser ver.
Os meus desandaram.
Não sei se é possível uma correção através de plástica, transformá-lo num cotovelo jovem. Talvez sim. Talvez até seja muito fácil para os especialistas dar cabo de cotovelos velhos. O que não deve existir é mercado.
Haverá alguém interessado em fazer plástica num cotovelo? Ora, com tantos lugares mais simpáticos para uma plástica, quem ousaria gastar as economias numa plástica de cotovelos? Ninguém! Nem eu. Talvez lá na frente alguém comece a remodelar as carninhas, descubram que não adiantam mil e uma plásticas se o cotovelo não for mexido; mas até lá eu já fui, você, quase todos nós.
Outro dia saí à rua à cata de cotovelos. Encontrei diversos como os meus e uma máquina da verdade instalada em nossos pobres corpos.
Você me pergunta então:
— Geia, mas o que eu faço? Os meus, como os seus, estão velhos!
Eu respondo:
— Não faça nada, amigo. Toque a vida. Ou, se achar isso broxante, faça como eu, denuncie. Mostre ao mundo a verdade. Quem sabe essa moda de reparar cotovelos chegue antes e a gente não entra nessa?
Se lhe servir de consolo eu digo, que se me perguntassem lá atrás, na melhor fase da vida, se eu gostaria de um dia ter cotovelos velhos, a resposta seria um sonoro SIM, e você, como inteligente que é, deve saber a razão.
Comentários
As suas Crônicas são fantásticas!
São lições de vida,na minha Humilde opinião.
Valeu, Darci. Os amigos estão correndo para o espelho depois da leitura rsrs
Irei ficar atento agora! RS!
Amei!