CRIME OU PECADO? >> Albir José Inácio da Silva
Nem quis ouvir o restante da
história, arrastou o filho pelas vielas abaixo. Também, ele começou pelo final,
pela bomba, pelo crime e, o que é pior, parecia ter muito orgulho do que fez.
O moleque já tinha se envolvido
em coisa ruim, mas melhorou de uns tempos para cá. Voltou pra escola, jogava
futebol, ia à missa e, no ano que vem, se apresentaria no quartel. Tinha que
fazer besteira de novo!
- O que é que foi, mãe, cê tá
devendo alguma coisa pro movimento? Virou X9? Por que a gente tá fugindo? –
Ainda se fazia de desentendido, o crapuloso.
Esgueiravam-se pela noite, quando
foram parados por dois soldados do tráfico que fumavam baseado. Mas foram logo
reconhecidos, e prosseguiram.
Já quase no asfalto, havia uma
patrulhinha displicente, com dois PMs que nem olharam pra eles. Mas Dona Chica
tremeu, tropeçou, quase desmaiou. O menino não estava entendendo. O que dera na
sua mãe? Desorientado, ele não tinha direito a explicações, só a andar, quase
correr.
Contornaram a igreja e Dona Chica
socou a porta da casa paroquial. O padre sabia que àquela hora era problema. Abriu
a porta, e a mulher quase caiu em cima dele.
- Padre, me
ajuda! Esse menino dessa vez passou do limite. Tá querendo morrer essa praga. O
que ele fez é uma blasfêmia, padre. Vai preso, matado e carregado pro inferno.
- E desde
quando alguém vai preso por blasfêmia, Chica? Deixa de maluquice! Isso aqui não
é o Afeganistão!
- Padre, com
Deus não se brinca! Esse peste tá perdido. Já devem tá procurando ele!
Isso não
estava cheirando bem. O padre não queria se envolver, não gostava de polícia. A
polícia não gostava dele, dizia que ele protegia vagabundo.
- Chica, eu já
estou perdendo a paciência com você! Afinal, o que foi que esse moleque fez?
Matou alguém?
- Matou não, Padre,
que o ofendido não morre. E, se morrer, ressuscita. Fez pior: falou prum juiz
que ele não é Deus!
Não se pode
dizer que o padre se tranquilizou, mas relaxou um pouco.
- E aonde foi
isso? No tribunal ou na rua?
Dona Chica
olhou pro filho, que finalmente pôde falar:
- Na vila
olímpica. É juiz de futebol.
Dona Chica
pegou o chinelo pra bater na cara do garoto, mas foram ambos expulsos. Ela
ainda conseguiu dizer:
- Seu padre,
juiz de futebol não é Deus, mas é juiz. Deve ser santo pelo menos. Não é melhor
o senhor receitar alguma penitência e umas ave-marias?
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