TENTANDO SER LEGAL >> Clara Braga

Um dia, eu ia almoçar com o pessoal do trabalho e, enquanto dirigia, meu amigo me perguntou: "Você nasceu em Brasília, né?" Respondi que sim, apesar da pergunta não ter nada a ver com o que estávamos conversando antes. Então ele fez a gentileza de explicar: "É porque o carro aqui do lado estava dando seta e você não deu passagem. Já reparei que essa é uma característica de quem mora aqui. Quando vocês veem alguém dando seta, em vez de dar passagem, alguns até aceleram.

Não tinha feito aquilo de propósito, nós estávamos conversando e eu, por estar um pouco distraída, não reparei que havia um carro dando seta. Mas tudo bem, eu confesso, às vezes não deixo as pessoas passarem de propósito, mas quem nunca? Aliás, a verdade é que aqui em Brasília as pessoas entram no carro e parece que se sentem como se estivessem em um videogame. Jogam o carro em cima dos outros, buzinam como se isso fosse fazer eles ganharem vida extra, aceleram para saírem na frente quando o sinal abre, cortam todo mundo, andam colados na traseira do carro da frente e, definitivamente, não te dão passagem quando você liga a seta.

Tive que dar razão para o meu amigo, que não é de Brasília e não gosta de dirigir por aqui, mas eu podia fazer algo a respeito. Decidi que essa seria minha nova meta, tentar sempre dar passagem quando algum carro próximo ligasse a seta. Acreditem, isso pode ser muito difícil. Parece que as pessoas se acostumaram com o fato de ninguém ser legal no trânsito, então ligam a seta, mas não entram, como se alguém dar passagem fosse uma espécie de pegadinha. Já tive que desacelerar muito meu carro para as pessoas entenderem que, sim, eu estava dando passagem, elas poderiam entrar com segurança. Ou talvez nem tanta segurança, pois o fato de eu desacelerar faz com que o carro de trás às vezes fique estressado e grude na traseira do meu, ou ultrapasse correndo, como se estivesse em uma corrida de kart.

Independente do trânsito estar louco e das pessoas estarem descompensadas, continuo na minha tentativa de ser legal e procuro sempre observar se eu também não estaria virando uma louca competitiva quando estou atrás do volante. E lembro sempre de uma amiga minha que uma vez me deu um livro e, antes que eu pudesse ver qual livro era, ela me alertou: "Olha, o título não é uma indireta, tá bom?" O título do tal livro era: "Como ser legal". Se não era uma indireta antes, agora pode até funcionar, não só para mim, mas para muita, muita gente!

Comentários

Fiquei surpreso com seu texto, Clara. No período que morei em Brasília, e nas vezes em que estava dirigindo, eu era muito bem impressionado com a educação e a gentileza dos motoristas daí. Será que tudo desandou desde agosto do ano passado?
Eduardo, tenho a impressão de que tudo desandou tão rápido que parece até que foi de Janeiro para cá! haha!

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