INVENTAMENTO EM ANDAMENTO >> Carla Dias >>
Ele acredita que o ser humano é filho da contradição. Não que isso lhe incomode, que pregar que todas as histórias já foram escritas e vividas, agora nos resta somente a repetição, bate de frente com o fervor do ser humano, do indivíduo, em se render à certeza de que é único. Para ele, os ingredientes desta contradição são inspiradores. Se tudo já foi criado e acontecido, e ainda assim exigimos ineditismo na identidade emocional e intelectual, é porque, talvez, ainda haja esperança de sermos, cada um sendo um, mas também sendo parte de um todo, do coletivo, resultado de peculiares e significativas versões.
Quem sabe o teatro, a ideia de se apossar de personagens, a ponto de torná-los tão críveis que fica quase impossível detectar duas pessoas nesse alojamento de espírito que é o corpo, não seja exclusividade dos atores. Que sabemos das nossas máscaras, dos personagens que interpretamos durante a vida, às vezes, para sobrevivermos a nós mesmos, em outras, para sobrevivermos aos que nos cercam.
Durante muito tempo, ele se permitiu ficar a sós com a pessoa que é, o que nem sempre é digesto, visto que, ele aposta, todos nós passamos bastante tempo a nos dizer mal, às vezes até a nos odiarmos com requinte. Duro mesmo é a autobenquerença, mas da que não venha acompanhada de prepotência. A experiência de se despir de nome, endereço, número de documento, de se tornar nômade, um anônimo a se esgueirar pela história de outros, transformou sua capacidade de observar a si e ao outro de outro ângulo. Ainda assim, não é um ângulo que expurgue a mediocridade humana, tampouco a sua capacidade de cometer atos de genuína bondade.
Compreender que a moeda explica, somos cara e coroa, permitiu a ele repensar a vida de uma forma menos melindrada. Na verdade, aquietar o coração é uma forma funcional de se abrir aos momentos mais férteis do que realmente importa nesse grande palco que é mundo. Como a sincronia, coisinha que ele busca desde sempre, da qual ainda não sentiu o gosto.
Conectar-se profundamente a outro ser humano – e às suas verdades e inventos – é o que espera que lhe aconteça, dia desses. E como apreciador das contradições, quando há nelas a possibilidade de uma combinação positiva de caminhos e desfechos, inspira-se a esperar pela oportunidade para tal acontecimento.
Porque assim caminha a sua vida e os seus deslumbramentos. Ele observa o mundo, as pessoas, os acontecimentos. Ele deseja o mundo, a pessoa, o acontecimento. Veste-se com personagens, interage com tantos outros. Sobe no palco da vida e desempenha papéis memoráveis, às vezes, nem tanto. Contradiz-se tantas vezes que já nem se desculpa mais por isso, apenas vive cada contradição com a humildade de quem sabe lidar com consequências.
Vive as versões de si mesmo, como se cada uma delas fosse a verdade de quem é. Mas isso porque acredita, e sem vestígios de dúvida, que a verdade de si é uma invenção em andamento. Uma obra que pede por adaptações, e que frequentemente exigirá manutenção. E a ideia de ser eternamente inacabado lhe fascina, pois cria espaço para o susto, para a surpresa, para a criação.
Imagem: sxc.hu
carladias.com
Quem sabe o teatro, a ideia de se apossar de personagens, a ponto de torná-los tão críveis que fica quase impossível detectar duas pessoas nesse alojamento de espírito que é o corpo, não seja exclusividade dos atores. Que sabemos das nossas máscaras, dos personagens que interpretamos durante a vida, às vezes, para sobrevivermos a nós mesmos, em outras, para sobrevivermos aos que nos cercam.
Durante muito tempo, ele se permitiu ficar a sós com a pessoa que é, o que nem sempre é digesto, visto que, ele aposta, todos nós passamos bastante tempo a nos dizer mal, às vezes até a nos odiarmos com requinte. Duro mesmo é a autobenquerença, mas da que não venha acompanhada de prepotência. A experiência de se despir de nome, endereço, número de documento, de se tornar nômade, um anônimo a se esgueirar pela história de outros, transformou sua capacidade de observar a si e ao outro de outro ângulo. Ainda assim, não é um ângulo que expurgue a mediocridade humana, tampouco a sua capacidade de cometer atos de genuína bondade.
Compreender que a moeda explica, somos cara e coroa, permitiu a ele repensar a vida de uma forma menos melindrada. Na verdade, aquietar o coração é uma forma funcional de se abrir aos momentos mais férteis do que realmente importa nesse grande palco que é mundo. Como a sincronia, coisinha que ele busca desde sempre, da qual ainda não sentiu o gosto.
Conectar-se profundamente a outro ser humano – e às suas verdades e inventos – é o que espera que lhe aconteça, dia desses. E como apreciador das contradições, quando há nelas a possibilidade de uma combinação positiva de caminhos e desfechos, inspira-se a esperar pela oportunidade para tal acontecimento.
Porque assim caminha a sua vida e os seus deslumbramentos. Ele observa o mundo, as pessoas, os acontecimentos. Ele deseja o mundo, a pessoa, o acontecimento. Veste-se com personagens, interage com tantos outros. Sobe no palco da vida e desempenha papéis memoráveis, às vezes, nem tanto. Contradiz-se tantas vezes que já nem se desculpa mais por isso, apenas vive cada contradição com a humildade de quem sabe lidar com consequências.
Vive as versões de si mesmo, como se cada uma delas fosse a verdade de quem é. Mas isso porque acredita, e sem vestígios de dúvida, que a verdade de si é uma invenção em andamento. Uma obra que pede por adaptações, e que frequentemente exigirá manutenção. E a ideia de ser eternamente inacabado lhe fascina, pois cria espaço para o susto, para a surpresa, para a criação.
Imagem: sxc.hu
carladias.com
Comentários
Albir... Isso, Albir. Também escrevo pra você :)