O DIÁRIO >> Whisner Fraga

Eu prometi que escreveria, todos os dias, algo para Helena, em um caderno que comprei no dia de seu nascimento. Naquele dia enchi doze laudas de uma história que não interessaria a ninguém mais do que nós. Nunca produzi tanto em uma única tarde. Continuei, durante os próximos quatro dias, preenchendo aquelas páginas, ansioso, febril. Era um momento de desabafo, não queria produzir literatura e sim notas, recados para um futuro, memórias.

No quinto dia encomendei outros cadernos em uma loja da Internet, mas continuei escrevendo naquele antigo, já um pouco desgastado. Depois o substituí por um novo. Claro que não consegui relatar algo sobre Helena todos os dias. Em algum momento eu estava tão cansado que não pude falar nada sobre minha filha. Foram poucas as vezes em que isso aconteceu. Digamos que, dos 365 dias de vida que esta menina linda faz esta semana, 340 estão esmiuçados no Diário que criei para ela. As anotações estão lado a lado com estudos de personagens, ideias para contos, versos soltos, trechos de algum livro que li. Tudo misturado, como gosto.

No dia 22 de janeiro de 2012, qualquer um que estiver de posse de meus relatos pode ler: “Helena faz 4 meses e 16 dias. Está comendo papa de banana, mamão e pera. Ana deu a ela 4 colheres de mamão gelado e ficou preocupada pensando se a menina pegaria uma gripe. Pesquisou e descobriu que o melhor a fazer é dar o leite do peito logo em seguida. Como foi exatamente o que ela fez, ficou sossegada. Helena faz um longo ruído com a boca quando está chateada. Gravei o barulho em um vídeo para não esquecer.” Abaixo, ainda no mesmo 22 de janeiro, acrescentei: “Livro: Entre a luxúria e o pudor. Autor: Paulo Sérgio do Carmo. Editora: Octavo. Hoje gravei aqui em casa mesmo um vídeo para a TV Brasil, pois não queria ir ao Rio de Janeiro. Amanhã enviarei carta para o Antonio Maura Barandiarán para sondar a possibilidade de uma tradução.”

E assim foram os dias, alguns fáceis, outros mais complicadinhos, como é a vida, de qualquer maneira. Helena completa um ano no próximo dia 06 e eu queria lhe dar esta crônica de presente. Não apenas a ela, mas também à sua mãe, Ana. Neste primeiro ano em que convivemos com essa criança tão linda, eu queria relatar uma tristeza que sofri. E por culpa minha. Ana vivia seu primeiro dia das mães e, não sei o motivo, não preparei nada para ela. Não lhe comprei um presente, não encomendei flores, apenas lhe dei os parabéns, pela manhã e pronto. Tenho certeza que, por mais que haja tamanha carga comercial na data, fui insensível. Devia ter preparado uma festa, no mínimo.

Não foram os choros, as birras, as grandes inseguranças de pais de primeira viagem, os pequenos sustos que nos dão um ser tão dependente, que me deixaram, muitas vezes, um tanto desconsolado. Foi este primeiro dia das mães de Ana e foi culpa minha. Pondero que para sempre ela se recordará da data como um dia vazio, de decepção. Então, minha filha Helena, esta crônica é para que nos lembremos que ano que vem temos a obrigação de preparar algo inesquecível para Ana, alguma coisa tão grande, tão bela, tão inesperada, tão surpreendente, como a imagem de seus dedinhos beliscando carinhosamente o pescoço sensível de sua mãe.

Comentários

André Ferrer disse…
Fico imaginando uma filha lendo uma homenagem assim quando tiver quinze, vinte anos. Além da forma e das expectativas cheias de pedantismo que, canonicamente, definem a Literatura, a boa Literatura, para mim, não passa de um recado bem recebido no futuro. Se uma pessoa apenas receber e ficar tocada, já valeu muito! Abraços Whisner!
Kamila Mendes disse…
que homenagem linda, tenho certeza de, que se a Ana ler essa crônica, ela entenderá como você se sente...parabéns!
Zoraya disse…
Nossa, Whisner,tão raro um homem fazer essa mea culpa, e ficou linda, tenho certeza de que Ana ficou muito feliz em ler essa crônica romântica. Parabéns e felicidades aos três!
albir disse…
Parabéns, Whisner, a cada um de vocês pelos outros dois.

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