O CORTE >> Fernanda Pinho
Faz pouco mais de um mês, talvez dois, que eu cismei que precisava cortar meu cabelo. Uma cisma completamente fundamentada porque meu cabelo já havia chegado a insustentáveis 65 centímetros (sim, eu meço meu cabelo com fita métrica. Há quem meça cintura. Eu acho bem menos traumático medir cabelo). E eu tenho cabelo demais, e ele cai demais, então era incômodo demais. Por onde eu passava, eu deixava pelo chão meu rastro capilar de 65 centímetros e, grande como estava, nem adiantava eu jogar a culpa na cabeça de outra pessoa, como eu costumo fazer quando ele está num tamanho razoável. Para dormir, um sacrifício. Cheguei a acordar algumas noites devido a um pesadelo que se repetia, com cobras me sufocando pelo pescoço. Abria os olhos e via que era o cabelo. Antes fossem cobras! Sem falar do fator estético. Eu vinha me sentindo o primo Itt da família Addams. Mas um primo Itt com pontas duplas, triplas, quádruplas. Culpa minha, reconheço. Depois de fazer luzes californianas, cerca de duas chapinhas por semana, ir à praia seis vezes em seis meses, e jogar uma tinta qualquer por cima de tudo isso, era praticamente impossível que não chegássemos a esse estado de calamidade. Passei a evitar espelhos e, quando eu olhava sem querer, levava um susto. Já não estava mais me reconhecendo.
Bom, talvez você já esteja se perguntando: "então por que diabos você não foi cortar esse cabelo?". Por causa da famigerada falta de tempo, por causa desse ciclo vicioso chamado vida que, às vezes, não dá brecha para coisas que não fazem parte do seu cotidiano - tipo, cortar o cabelo. E aí teve uma semana em que eu estive de cama, outra semana em que eu viajei, outra em que eu estive cobrindo um congresso. Quando me dei conta, já estava há semanas nesse sofrimento. Mas sábado passado eu bati o martelo e avisei (para eu mesma): desse final de semana não passa. Marquei com o cabeleireiro (odeio escrever essa palavra) e fui.
- Corta, por favor. No mínimo, um palmo.
Avisei decidida.
- Você tá doida? Seu cabelo tá lindo!
Ai, era só o que me faltava. O cabelo é meu e eu faço dele o que eu quiser. Que cabeleireiro (copiei e colei) mais apegado!
- Não, ele cresce rápido. E um palmo nem é tanto assim. Pode cortar.
- Tudo bem, mas um palmo fechado, né?
- Não. Aberto.
- Um palmo da sua mão ou da minha?
- Da sua mão que é maior. E pode cortar a franja também.
E, então, cheio de dor no coração, ele cortou. Que alívio. Quando me levantei da cadeira eu me sentia 200 quilos mais leve. Acho que saí do salão flutuando e talvez tenha até sorrido para uns desconhecidos na rua. Nem fui para casa. Passei no shopping para comprar alguma coisa que combinasse com meu novo cabelo. "Meu Deus, por que eu não me proporcionei essa alegria antes?", era o que eu me perguntava. Porque nós somos bobos e, quase sempre, nos esquecemos que a alegria está nas pequenas coisas.
Depois do shopping fui, enfim, para casa. Mostrei empolgada o novo corte para minha mãe e minha irmã e elas também adoraram. Como não? Do jeito que meu cabelo estava antes, qualquer um adoraria. Até meu pai notou que eu havia cortado o cabelo. O que era um bom indicador de que, realmente, havia feito diferença.
Então fui para o banheiro, namorar meu novo visual no espelho. E quando eu me encarei fixamente, chorei de arrependimento. Queria meu cabelo de volta!
Comentários
Esse é um típico relato de uma libriana típica!!!!
E vc tá linda, desapega mesmo, viu?
Beijos
Loreyne
Mil bjs ♥
Bjs!
Beijocas!
Muito bom seu texto! Gostei!
Corta, não corta, muito, pouco... ficou bom, ficou ruim...
Faz parte do dia-a-dia de todas nós!
Abraços
Leila Rodrigues