SOBRE ENVELHECER E SER FORTE >> Mariana Scherma

Se o problema fosse só envelhecer, beleza. Uma coisa é superar o seu cabelo branco, as suas marcas de expressão, aquela ruga que só engrossa perto dos seus olhos e o seu bumbum que, por mais que você faça os agachamentos mais torturantes na academia, não é o mesmo de um tempo atrás. Com esses “problemas”, a gente se acostuma. Descobre outras qualidades e segue a vida. O autoenvelhecimento é isso. Mas e quanto a ver seus pais ficarem cada dia mais velhinhos e ter que admitir que eles não são eternos?

Essa resposta aí eu não tenho. Bem que queria. Uma coisa é aceitar o tempo passando pra você, mas para eles? Poxa, Deus e demais senhores aí da cúpula de cima. Encarar que o ser humano, em geral, tem suas fraquezas em relação aos anos que só correm é quase poético. Mas notar que seus pais enfraquecem com a idade é tenebroso, dói na alma. Essa sinceridade de agora é porque, mais uma vez, meu pai (que também faz bico de meu ídolo, meu grande amigo e meu mestre) precisa encarar mais uma cirurgia. Até hoje, meu dia mais triste foi a primeira cirurgia que ele fez. Superou. Ficou bem.

Com essa vai ser a mesma coisa. O problema é sentir a angústia dele e não poder pegá-la e jogar fora, sabe? Queria dizer para o meu pai que ele vai ser eterno — eterno, lúcido e forte. Queria deixar bem claro que ele não precisa ter medo, que já, já o medo passa. Mas como se eu também estou morrendo de medo por dentro? Disfarço. A sorte é que meu otimismo pesa mais que o medo. Queria avisar que os únicos problemas que ele vai sentir na pele são as derrotas do Corinthians, mas não dá.

Hoje só consegui dizer que ele é o homem da minha vida. Insuperável. Insubstituível. O cara. Pra mim, ele é eterno e imbatível. E ele vai ficar mais imbatível depois dessa. O mundo anda muito cruel, precisa do meu pai pra deixar a vida mais bem-humorada, mais inteligente. A crônica de hoje está curtinha porque as palavras não estão chegando fácil. Mas vai melhorar. Se nada é eterno, a angústia também não pode ser.

Comentários

Zoraya disse…
Bela crônica, Mariana. Todos nós que amamos nossos pais sentimos a mesma coisa. Melhoras pra ele, que tudo corra bem.
Analu Faria disse…
Deixar ir o tempo é um exercício mais difícil que os agachamentos torturante...
tecido de vozes disse…
Querida Mariana: a sua crônica é linda e profunda porque toca o meu coração de mãe, avo, filha, escritora, leitora, um ser frágil que eu sei que sou e que busco fortaleza nas grandezas da vida; grandeza assim a exemplo das suas crônicas. Sinto-me privilegiada em ler esse texto que vem aliviar o medo que estou sentindo de "perder" a minha maezinha. Ela tem 94 anos. Em casa, estamos fazendo o possível para que ela tenha uma passagem serena.
Cordialmente,
Graça Graúna
"Si todo empieza y todo tiene un final,
hay que pensar que la tristeza también
se va,
se va,
se fue..."
(Jorge Drexler)
Carla Dias disse…
Apesar da sua apreensão, eu só consigo pensar em como seu pai tem sorte de ter uma filha como você, que o enxerga e cuida. Que a boa sorte lhes acompanhe.

Postagens mais visitadas