FIM DE ANO COM OBSTÁCULOS... E PASSAS >> Mariana Scherma
Duas
aventuras nada bem-vindas na minha vida: supermercado e shopping no fim do ano.
São os dois lugares em que só vou porque preciso, mais ou menos a mesma coisa
que a ida periódica ao médico. Talvez eu até prefira o médico, se tiver certeza
de que ele não vai me deixar esperando duas horas na mesma sala que uma porção
de revistas Caras mostrando as “notícias” de um ano que já passou faz tempo.
Moro
numa cidade quente e (suspiros de tristeza...) sem praia. Ou seja: adivinha
onde todo mundo vai passar o fim de semana! Lógico que no shopping, ainda não
sei se pra comprar os benditos presentes ou se pra curtir o ar condicionado.
Mas eles estão lá: sábado na hora do almoço, sábado à tarde e domingo a partir
da hora que acordam, fazendo uma caminhada normal virar A Interminável Caminhada
Com Obstáculos. Ãham. Andar num shopping lotado, com as pessoas paralisadas
pelas vitrines (acho até uma cena meio de zumbis) é bem pior que uma corrida
com obstáculos. O obstáculo tá lá parado. As pessoas, não: elas andam e de
repente param na sua frente, não veem o seu pé e lá vai um pisão. Sério, tenta
olhar uma vitrine com atenção: você vai precisar desviar de uma meia dúzia de
gente (ou bem mais) zanzando sem destino.
Minha
birra com o Natal é que as pessoas ficam enlouquecidas e querem mostrar aos
amigos e parentes todo o carinho que economizaram nos outros meses comprando
uma lembrancinha (o 13º salário tem ônus, olha só!). Aí não dá outra: o
shopping vira o cenário perfeito pra um filme de terror. Ou guerra. Ou luta
porque é inevitável você acabar apanhando da fulana que anda com 32 sacolas nas
duas mãos mais um sorvete de casquinha e acha que ocupa o espaço de uma pessoa
só. Já sugeri em casa de comemorarmos o Natal em janeiro, quando os shoppings
se tornam menos impossíveis e ainda dão descontos. Minha mãe riu da minha cara.
Ela me acha a maior pão-dura do universo.
Supermercado
pra mim tem efeito parecido, talvez até pior. Inesquecível (no péssimo sentido)
foi quando eu estava esperando minha vez na sessão de frios e tinha um sujeito
escolhendo bacon. Toda vez que ele pedia à atendente pra mostrar um novo pedaço
do coitado do porco, eu me esforçava pra não demonstrar reação. Só tinha um
vidro separando ele do bacon, por que a pobre da moça tinha que mostrar o bacon
na mão? “É bacon, meu senhor, qualquer um desses pedaços vai entupir suas
artérias do mesmo jeito”, uma frase que consegui engolir e que prova que se
trabalhasse no lugar da atendente não duraria um dia no emprego. É só ver um
supermercado lotado que minha mãe e eu nos revezamos: tática de guerra mesmo,
"você pega as frutas, eu fico nos frios, passo nas carnes e quem terminar
antes corre pra fila no caixa". Combinado. Valendo!
Já
esqueci a ideia de inferno pegando fogo, pra mim inferno é o supermercado na
véspera de Natal e Ano-Novo. A impressão que dá é que as pessoas deixam pra
comer só nessa época e aí a coisa fica meio Saramago em Ensaio Sobre A
Cegueira. Sou a favor de ceias magrinhas, sem essa loucura da carne de porco,
das castanhas, das sobremesas de chantilly e do arroz amarelo com passas (que, se fosse gostoso de verdade, substituiria o arroz branquinho o ano
todo, né?). É uma refeição num país tropical, caramba.
Nessa
semana, um novo shopping será inaugurado aqui na cidade onde moro. Não tô
soltando fogos de artifício por conta disso, mas me deu um minialívio. Enquanto
todo mundo vai correndo checar as novidades, eu vou ao velho shopping mesmo.
Com muito foco, sou capaz de comprar os presentes em uma hora (é, eu não sou o
tipo que distribui lembrancinhas pra toda lista de contato, só para os mais
queridos mesmo). A minha sorte é que quem cuida da ceia é minha mãe – e nenhum
supermercado abarrotado é capaz de tirar dela a paixão por fazer compras (taí
uma característica nada genética). Como ela sabe da minha falta de paciência, minha
tarefa é só dizer o que eu quero comer. Vou pedir o pavê de sempre. E esperar
do fundo do coração pra que ela desencane das passas no arroz. Um milagre de
Natal, quem sabe?
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