Encantado >> Eduardo Loureiro Jr.

Quem não está em seu canto, onde está? Desencantou-se para onde? Em que outro lugar alheio a si mesmo se esconde?
As pessoas desencantadas não têm a cara do lugar em que estão. Algumas reclamam: querem que o lugar em questão seja o canto. Outras desistem: não sabem tomar o rumo de volta e deixam-se ficar por cansaço de perdição. Há uma plaquinha em sua testa: ESTE LUGAR NÃO É O MEU CANTO.
Encantar as pessoas desencantadas, eis o meu leme de barco, e navego.
As pessoas desencantadas estão entre pedras sem serem das pedras. Estão dentro d'água sem serem da água. Estão inflamadas sem serem do fogo. Estão avoadas sem serem do vento.
Têm dor de cabeça, as pessoas desencantadas, pelo peso da placa que carregam na testa. Nem lembram como saíram de seus cantos para os cantos de outros. O canto do outro é o desencanto do próprio canto.
Encantar as pessoas desencantadas, eis meu lembrete — de gente — de barco que passa.
Encanto meu não traz ao meu canto. Meu canto não é destino, é viagem até o canto teu.
Desencantado que se alheia no encantador apenas troca o canto que não é seu por outro, que também não.
Encantar as pessoas desencantadas, eis o meu lê-me.
Encanto meu está nas palavras que movem de lugar. Encanto meu vem do meu canto quando me deixo estar. Encanto meu é de pedra para os que são de pedra, de água para os que são de água, de chama para os de fogo, de sopro para os de ar.
Desencantado que me lê assim — sabendo o próprio canto a que é seu chegar — me desencanta, também, do meu não-lugar.
Encantar a pessoa desencantada: eis-me a me remar.
Braços de meu próprio canto levando o resto de mim para o meu lugar. Tempo já e tempo ainda no balanço de navegar.
Braços que roçam outros braços até o destino chegar: um para mim, outro para ti. Fica, que eu me vou. Vai, que eu fico cá. Ou fiquemos juntos. Ou vamos juntos. Quem saberá.
Encantar a pessoa desencantada, eis o que há.
Cada qual no seu canto. Até que se possa levar o próprio canto para qualquer lugar. Então o teu canto será o meu canto sem riscos de desencantar.
Destino final desse navegar é desencantar do próprio canto encantado. Viajar. Depois desencantar do barco, e mergulhar. E, enfim, desencantar do mergulho e encantar-se mar.
Comentários
Que me aquece e me faz carinho?
De onde vem essa coisa tão crua
Que me acorda e me põe no meio da rua?
É um lamento, um canto mais puro
Que me ilumina a casa escura
É minha força, é nossa energia
Que vem de longe prá nos fazer companhia.."
Vide o vídeo:
http://www.youtube.com/watch?v=VyGGQ1ahsI8&feature=related
Bjoca,
Anônima, a água das lágrimas dá um tom rosado ao vermelho sangue que está por vir. :)
Brigadim, Albir. A gente faz o que pode pra se encantar encantando. :)
Gostei muito.
E eu pensei que sabia alguma coisa à respeito de "mistério de palavras"...rsrsrs
Valeu.Um abraço. Elaine
Um beijo
e eu, sem saber, escrevi uma crônica (pra amanhã) falando um monte, quando queria apenas dizer que sinto-me desencatada porque estou longe do meu canto...
Mas você é quem sabia, sem eu nem saber...
bjs!
Ana