VOCÊ TEM MEDO DE QUÊ? >> Felipe Holder




Tem gente que gosta de alardear a própria coragem, dizendo que não tem medo de nada. Eu duvido. Todo mundo tem medo de alguma coisa, por mais que diga que não. Uns têm medo de morrer, outros têm medo de viver, outros têm medo de palhaço... tem gente até — imagine você! — que tem medo de borboleta!

Quando eu era pequeno tinha muitos medos: medo dos monstros de Perdidos no Espaço, medo dos filmes de Vincent Price, medo de ouvir o galo cantar de madrugada, mas o meu maior medo mesmo era medo do escuro. Medo comum, que quase todas as crianças têm, mas só que o meu não era exatamente medo. Era pavor. Eu tinha pavor do escuro. Depois de grande (bem grandinho, para ser mais preciso) o medo foi embora. E não foi por descobrir que o bicho-papão não existia, ou por saber que os fantasmas não iriam se aproveitar para aparecer na minha frente quando a luz se apagasse; simplesmente o medo foi embora. Inexplicavelmente.

Medo é mesmo uma coisa inexplicável. Você se lembra da campanha presidencial de 2002?
Naquele ano, Regina Duarte apareceu no programa eleitoral de Serra pra dizer que tinha medo do que poderia ser do Brasil se Lula fosse eleito presidente. Caminhávamos para nos transformar uma “Argentina”; seria o caos e a (perdão pela palavra deselegante) merda iria virar boné. Foi criticada, hostilizada, e seu depoimento sumiu da telinha. Mas sumiu para dar lugar a outro, cuidadosamente preparado para ser ainda mais aterrorizante: depois de Regina Duarte, quem apareceu na TV para dizer que tinha medo foi Beatriz Segall. E foi mesmo assustador. Ela disse que estava “com medo de dizer que tinha medo”. Fui levado a crer que seria medo dos eleitores de Lula. Medo, talvez, de ser linchada por eles em praça pública só porque ousou dizer o que pensava. Eu, hein? Ambas disseram ter medo do Lula presidente, mas nenhuma delas teve medo do ridículo. Vá entender...

Hoje, depois de grande, continuo tendo meus medos. Medo de aranha caranguejeira (a de verdade, esclareço, antes de qualquer insinuação maldosa), medo de errar, medo de decepcionar as pessoas de que gosto, medo de não ser um bom pai, medo da violência, medo de ver nossa cultura ainda mais desprezada e desvalorizada, medo de ver a mediocridade tomar conta do nosso país, medo de o Brasil não ter mais jeito.

E você? Tem medo? De quê?

Comentários

Anônimo disse…
Oi Felipe,
Muito bom ler sua crônica! Talvez porque me considerava uma pessoa medrosa até ontem, quando ouvi da minha mestra uma definição de corajoso, que me fez mudar de opinião sobre os medrosos, inclusive eu. Disse ela: Corajoso é aquele que se move apesar do medo.
Monica
Chef disse…
Monica, gostei muito da definição de sua mestra. Devo ser corajoso, pois se há uma coisa que eu não faço quando tenho medo é ficar parado. ;)
Um abraço!
Anônimo disse…
Olá Filipe,
Gostei muito da sua crónica, eu também tenho alguns medos ex: do telefone a tocar no meio da noite...é cá um susto!!!
Na terra onde nasci(Peniche-Portugal) existem alguns provérbios engraçados:
-O medo dá asas
-O medo é pai da crença
-Quem tem medo morre cedo
-Nada é tão contagioso como o medo
-O medroso até da sombra tem medo
-Quem tem medo compra um cão
Vamos ser valentes?
Estrela
Aline disse…
- Você tem medo de quê?
- Tenho medo do escuro. É um medo infantil, eu sei, mas é o meu medo. Minha mãe nunca deixou que eu acreditasse em bicho papão, mas permitiu que eu cresse em fantasmas. E o escuro não é nada, só a falta de luz, ela dizia. E era isso que mais me apavora, porque sem luz, não podemos ver nada. E só porque não podemos ver, não significa que não exista. Eu tenho medo do que não posso ver.
Dos males, o menor. O escuro não permanecesse o tempo todo, então, há uma hora em que não tenho medo de nada.
E é nessa hora que eu conquisto muitas coisas ao ler crônicas excelentes como essa.
Chef disse…
Mônica, Estrela e Aline, obrigado pelos comentários tão gentis.

Espero perder em breve a preguiça de escrever, já que o medo eu perdi faz tempo. ;)

Preguiça... aí está um assunto interessante para uma nova crônica. :)
Meu querido amigo, medo que eu tenho é quando você pára de escrever: medo de que você não volte mais. :) Lendo suas crônicas tão gentilmente humoradas, sinto-me sem medo.
Anônimo disse…
olá Felipe! Gostei muito de sua crônica! Achei muito bem escrita, com humor e inteligência! Continue escrevendo, tem jeito pra coisa!
Abraço, Teresa.
Anônimo disse…
tenho medo de palhaçaos e boneca
Anônimo disse…
Tenho medo de tempestades: vento, chuva, trovoada... Cheguei a essa crônica enquanto procurava algo que me distraísse da ansiedade, já que no momento chove muito aqui na minha cidade. Ainda sou uma adolescente, mal vejo a hora de acordar um dia e perceber que esse medo (muitas vezes exagerado) me deixou. Enquanto isso, sigo enfrentando.

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