O MENINO >> Sergio Geia
Era o último da fila.
A padaria, naquela manhã ensolarada de domingo, bombava. De repente, vi o menino chegar à porta, entrar e parar na frente daquele que pagava o seu desjejum:
— Vô, o senhor me leva pra assistir Vingadores: Ultimato? Me leva, vô?
Era um garoto de pouco mais de cinco anos, que na sua tenacidade eloquente, como se assistir ao filme fosse a coisa mais importante de sua vida, e ainda que fosse novato no uso das palavras, dirigia-se ao avô com olhar de espanto, força, vigor.
E como o avô sequer respondia, limitando-se a cafunés esparsos em sua cabeleira, ao tempo em que prestava atenção à moça do caixa que enumerava os componentes da conta, ainda completou:
— Vô, no Vingadores: Ultimato tem o Homem Aranha, vô! O Homem Aranha é bom! Me leva, vô, no cinema, pra assistir os Vingadores: Ultimato?
Pobre vô, pensei, na minha inocência de quem não sabe nada da vida.
Na certa tinha coisa mais importante a fazer. Talvez achasse que a tarefa seria mais indicada para os pais e não para ele, já velho, cansado, sem paciência com a vida, ainda mais sentar num lugar fechado, escuro, barulhento, e ficar horas assistindo bobagens. Num domingo de sol? Melhor um boteco, ou o futebol amador.
Me lembrei de tempos idos, um outro menino apaixonado por futebol que no Bar do Baixinho, não largava a calça do pai, pedindo que ele o levasse para assistir ao jogo de seu time contra a Ponte Preta, talvez com a mesma tenacidade e dureza de olhar daquele menino, só sossegando com a promessa do pai, promessa logo desfeita ao chegarem em casa.
Mas, para a minha surpresa e espanto, tão logo quitada a conta, o avô se dirigiu ao neto com toda calma e atenção, como se aquele menino fosse a coisa mais importante de sua vida, olhou fundo aquele olhar feroz e duro e disse essas palavrinhas mágicas:
— O vô leva sim. Vamos para a casa, e mais tarde compramos as entradas.
O garoto deu um salto de alegria, correndo para junto da mãe que o esperava porta afora para contar a novidade.
Eu sorri junto, talvez com a mesma alegria daquele menino, torcendo para que a promessa do avô não fosse vã.
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