QUANDO O SOL SE PÕE DENTRO DE UM CAFÉ
>> Cristiana Moura


Não havia mesa livre como de costume. Esqueci-me do desconforto da cadeira alta na simpatia larga do rapaz do outro lado do balcão. Tomava meu chá e observava os passantes do lado de fora do café. Alguns paravam para olhar o cardápio através do vidro.  Do lado de cá temos uma impressão divertida de que eles é que estão dentro de uma vitrine.

Sim, uma vitrine de manequins vivos. A luz do Sol adentrando o recinto através do vidro parece não lhes dar permissão para enxergar o lado de dentro. A moça para, olha talvez o cardápio e, por certo, a si mesma. Arruma o cabelo, passa batom. Ela percebe que está sendo observada e o jeito sem jeito da moça se faz diversão pro mundo do lado de cá. Leandro, o rapaz vendendo cafés e simpatia detrás do balcão, ri. Nasce uma descontração solta do tudo igual do trabalho no café.

Leandro conta que é sempre assim quando é antes do pôr do sol. A luz transforma o vidro em espelho e o pessoal se arruma, faz careta e, se percebe que estamos vendo daqui, é um desconcerto só. Vai contando e rindo um riso daqueles de canto de boca. Parece que os narcisos se afogando na vitrine do café contribuem para a simpatia do rapaz que já traz no olhar o cansaço da semana inteira de trabalho.

Eu tomo meu chá. Leandro guarda xícaras, copos e pires com destreza e intimidade, sem perceber que seus utensílios são instrumentos criando música para os chás e cafés de fim de tarde.

O Sol se pôs e fiquei aqui pensando o que será que, nesta vida, de tanta luz, me ofusca também.

Comentários

Zoraya disse…
Que beleza de crônica a partir de um chá, hein, Cris? Linda de beber.
Cristiana Moura disse…
Tá aí, Zoraya, quero beber crônicas!

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