VUVUPENISVAGINAZELA
>> Eduardo Loureiro Jr.
É muita vuvuzela para meus ouvidos bossa-nova.
E não estou — ainda — falando das cornetas sul-africanas. Falo mesmo da fala, do falatório, da verborréia, do disse-me-disse, da conversa, da eloquência, da língua, do blablablá...
Um homem fala, em média, 2.000 palavras por dia. A mulher, 7.000. Isso por baixo, porque há outras pesquisas que apontam placares ainda mais dilatados a favor — ou contra — as mulheres. Esses números só me levam à conclusão de que eu não sou nem homem nem mulher, porque se falo mais de 1.000 palavras por dia, já sinto a boca seca e os lábios rachados do esforço. E me dou por feliz se passo um dia inteiro em completo silêncio, sem pronunciar nem "bom dia", nem "por favor", nem "saúde", nem "obrigado".
Mas a verdade é que as mulheres falam mais, bem mais, do que os homens, e não é preciso fazer pesquisa para constatar tamanha obviedade. Quem tiver ouvidos para ouvir, ouça. Eu já não tenho mais ouvidos para isso.
A culpa de tudo, claro, é de Deus. Ao criar os seres humanos, ele deu o falo apenas aos homens e compensou a falta nas mulheres com a fala. Embora eu não duvide que Deus, se perguntado sobre o assunto, vá dizer que ele apenas atendeu a uma reclamação das mulheres — ou seja, elas já falavam demais antes mesmo dele lhes conceder esse "privilégio". É a velha história de quem nasceu primeiro, a fala ou a reclamação.
Então me aparecem as vuvuzelas africanas, que me irritavam no início — não me irritam mais. Descobri que as vuvuzelas são apenas a expressão material da distorção sonora que infesta a humanidade. A vuvuzela é falo e fala. Se existe a lenda de que o falo dos africanos é maior do que o das outras raças, é de se imaginar — com terror, evidentemente — quão maior é a fala das africanas. E, antes que me acusem de racismo, digo que isso foi só um bobo exercício de lógica: não acredito na supremacia fálica — de falo e de fala — de africanos e africanas. Esse exagero acústico se apresenta em todas as cores, roupas e tipos de cabelo.
As vuvuzelas que eu criticava — pobres coitadas, compridas e barulhentas — não são nada comparadas às vuvupenisvaginazelas que escuto desde criança. Como falam as pessoas! ("Falam demais por não ter nada a dizer", disse o não menos verborrágico Renato Russo.) Já são 39 anos, quase 40, aguentando esse zumbido ensurdecedor todo santo dia.
Hoje compramos água, dizem que um dia teremos que comprar ar. Eu estou mais preocupado com o dia em que teremos que comprar silêncio, porque justamente esses dias, mesmo eu estando com meu extrato bancário mais para boi garantido do que para boi caprichoso, mais para encarnado do que para azul, eu teria feito um empréstimo de bom grado, mesmo a juros altos, para comprar um pouco de silêncio se eu tivesse encontrado o produto à disposição. Mas está em falta. Então cá estou com meus ouvidos latejando do tanto que se fala.
Eu lhes juro que neste momento, e pelos próximos quinze dias, a única coisa que eu ouviria de bom grado seria "Para ver as meninas", do Paulinho da Viola, na voz do Jards Macalé.
Estou com um desejo de mulher grávida por uma praia deserta. E não precisa nem ser praia, se for deserto, mas deserto mesmo, desertinho da silva, já considero meu pedido atendido. Enquanto isso, façam-me um favor: soprem uma vuvuzela quantas vezes quiserem no meu ouvido, mas nem pensem em acionar as suas vuvupenisvaginazelas. As vuvuzelas de plástico são mais sinceras que as de carne em sua intenção de incomodar. E nesses dias está valendo mais um inimigo declarado do que falsos amigos.
Silêncio, por favor.
Comentários
Bjos!
acho que não sou uma mulher "perfeita"....rsss
adorei a crônica
beijokkas em silêncio
Klaudya
Prepare os ouvidos...Quem escreve o que quer, pode ouvir o que não quer :o)
Bj,
Tia Monca
mto bom