AMOR EM NÚMEROS >> Eduardo Loureiro Jr.

O SETE está acima da média, e muitos o consideram um bom partido, a perfeição dentro do possível. Deve até ter muita gente de olho grande no nosso SETE, mas é irresistível pensar que, se conseguimos um SETE, podemos conseguir coisa ainda melhor.
O OITO, por exemplo, é melhor que o SETE. Infinitamente melhor -- quando deitado. O OITO é sedutor, sabe as curvas, os desvios, os atalhos. Mas, assim como sabe chegar, também sabe partir, e ficamos desconfiados. O OITO é bom para dar uma animada, para sacudir a poeira, não para um comprometimento sério.
Já o NOVE está quase lá. Está tão quase lá que a gente suspeita. Ou é muito marketing, muita fachada, ou, pior, o NOVE é preguiçoso. Sim, porque como pode estar tão pertinho do DEZ e não ser DEZ? O NOVE nos dá aquela sensação de que vai criar barriga, de que vai se acomodar, de que noves fora, nada.
Na falta do DEZ -- e do que fazer -- a gente, só por curiosidade, fica a ver e pensar nos outros. SEIS e CINCO, por exemplo, os medianos. Aqueles que quase todo mundo tem em casa: os que trabalham oito horas por dia, os que roncam, os que veem novela e assistem ao futebol. Sim, eles são necessários para o equilíbrio da sociedade. Não são bons o suficiente para a gente, mas têm lá sua utilidade.
Já o QUATRO e o TRÊS são desprezíveis, os reprovados. São, no mínimo, irresponsáveis. Em alguns casos, desleais ou até mesmo cafajestes. São o aluno que cola, o sonso infiel. É incrível como há quem os queira, às vezes até uns amigos nossos. Mas na nossa casa não entram, a não ser pelas notícias trágicas dos telejornais ou pela boataria da fofoca.
Só não sejamos muito duros com o DOIS e o UM. Eles são os coitadinhos, as vítimas do sistema, os excluídos, os fracos. Enquanto o DEZ não vem -- e parece que o DEZ nunca vem --, a gente se permite fazer uma caridade, acolher um DOIS, ou até mesmo um UM, confortá-lo, reabilitá-lo, salvá-lo. Afinal, nós somos bons, e os bons praticam a boa ação.
E então -- ou porque estamos cansados, ou frustrados, ou apenas distraídos -- topamos com o ZERO: a tela branca e vazia. Em si, o ZERO é nulo, mas, colocado ali ao nosso lado, recebe toda a nossa projeção de grandeza e adquire ares de dezena. Iludimo-nos que seja o DEZ e, quando nos desiludimos, racionalizamos que é melhor ainda que o DEZ porque é humilde, porque não resiste, porque aceita em nós tudo que rejeitamos em todos.
E quase nunca nos perguntamos qual é o nosso número.
Comentários
alguns vão de 0 a 10 e retornam dentro de poucas horas e quase nos conseguem enlouqueder!!! É preciso ficar bem atenta, inclusive às variações do 3,5 e até do 11, em alguns momentos, como quando se recebe flores do viajante...
Bjs!
Bom identificar que viajo do 0 ao 10 :o)
Bj,
Tia Monca
Querida, só você mesmo pra acrescentar um 11 e um 3,5. :)
Carla, desconfio de que você não é número: é letra.
Isso é que é versatilidade, Tia Monca.
Gosto da tela branca, vazia... E as palavras: junção e humildade sempre me atraíram. Que tal a união de dois zeros e a partir daí, um passeio na escala de um a dez? Afinal de contas, todos nós temos um pouco de mocinho e de bandidos. Quem sabe desse encontro possa surgir o famoso casal vinte... É “Vivendo, Amando e Aprendendo” (Leo Buscaglia) que chegaremos lá, na felicidade possível...
Pitágoras teve seus átomos revigorados...
Grande abraço acreano,
Marcos Afonso.
Eita, Marcos, agora fiquei curioso pelos amores de Pitágoras. A Sociedade Filosófica já tratou desse assunto dos amores dos filósofos? Ou será que eles nunca pensam "naquilo"? :)
E eu que, ingenuamente, pensava que você dominava apenas as palavras...
Sua visão, entretanto, desse mal costume humano, é suave, fraterna, especialmente quando alinha o zero e o dez, as polaridades que se tornam unas.
Vou continuar lendo o que você escreve!
Ivan, que bom que ultrapassou a aparência de julgamento. Também tenho evitado julgar (afinal, que conhecimento temos para tanto?), mas de vez em quando é importante mostrar ao julgador que existe em nós que, mesmo que quiséssemos julgar, isso seria pelo menos falho, ou mesmo impossível. Confrontar o julgador com um sistema explícito e limitado de julgamento, como esse que tentei delinear na crônica, às vezes leva o julgador a questionar seu hábito de julgar. :) E daí pode nascer a liberdade das infinitas possibilidades de ser e deixar ser.
Abraços.