O MARTELO DO BEM - Final >> Albir José Inácio da Silva
(Continuação de 16/12/2019)
Zé Pedro vai à cozinha e volta
com uma lata que despeja sobre as duas. O querosene que escorre para o chão está
vermelho de sangue. O interrogatório continua, agora com a caixa de fósforos
nas mãos.
- Vocês são loucos!
- E vocês são bruxas! Onde está o
menino?
Zé Pedro risca o fósforo.
Zé João assopra a chama e arranca
a caixa das mãos do outro.
- Não somos assassinos! Queremos
justiça! Vamos achar o menino.
- Isso se ele já não foi
sacrificado em algum ritual! – protestou Zé Pedro.
Como se tivessem combinado, as
duas se levantam ao mesmo tempo e atacam, mas são novamente derrubadas a socos
e pontapés.
- Não querem ser macho? Então
podem apanhar como homem! – grita Zé Pedro.
Déti veste pijama e Margô,
camisola. Num tom de generosidade, eles sugerem que elas coloquem mais alguma roupa.
Mas elas recusam, dizendo que não vão a lugar nenhum.
Zé Antônio amarra as duas pelos
pulsos e as obriga a se levantarem. Cambaleantes, são puxadas pela rua.
Na Praça, iluminada ainda pelas
luzes da festa, está Das Dores em convulsões e cercada por uma dúzia de pessoas.
Entre eles, Penha, que alterna palavras de consolo e admoestações pela falta de
cuidado com o menino.
A reverenda fica chocada com a
chegada das duas mulheres seminuas, manietadas e sangrando. Zé Antônio segura a
corda puxando-as pela frente, enquanto os outros dois as fustigam com
empurrões.
- O que vocês estão fazendo?! – grita
Penha.
- Nada ainda, Irmã, mas elas deviam
ser apedrejadas - responde Zé Pedro.
- A máscara estava com elas –
disse Zé João, mostrando a cara do Batman. - O garoto pode ter virado oferenda pra
algum demônio!
- O Zé Pedro queria queimar,
Irmã, nós é que não deixamos! – disse Zé Antônio.
- Lugar de bruxa é na fogueira! –
protestou Zé Pedro.
Penha assume a liderança,
afetando generosidade:
- Muito bem, já chega! Eu vou
desamarrá-las! Basta que me digam onde está a criança.
Margô se descontrola:
- Para com esse teatrinho, fariseia!
Você comandou tudo isto! Vai queimar no inferno, mas antes vai mofar na cadeia,
sua terrorista!
- Muito cuidado, mocinhas! Vocês
não estão em condições de fazer ameaças! Eu dou a minha vida por este lugar. O
que eu faço aqui é apagar incêndios e apascentar um bando de idiotas para que
não se matem. Agora digam logo onde está esse menino ou as coisas vão piorar!
A um gesto de Penha, as duas
mulheres são amarradas numa árvore pelos pés, cintura e pescoço.
O carro do Sargento entra
correndo na praça e freia quase em cima do grupo. Renova-se a esperança das
prisioneiras. Penha relata os últimos acontecimentos e pede que a autoridade
assuma o caso.
- Não gosto desses moleques,
irmã, mas dessa vez eles têm razão, elas têm que falar. Eu não posso fazer o
que precisa ser feito, a lei não permite, mas vocês podem. E eu posso não saber
de nada. Façam o que manda a lei de Deus porque a lei dos homens é frouxa.
Déti se desespera e diz que
encontraram a máscara no caminho de volta pra casa e não viram o menino depois
da festa. Mas ninguém a ouve.
Mais um carro chega à praça em
disparada, uma caminhonete com a marca do Sítio Olho D’água. Padre Antônio abre
a porta antes de parar.
- Que diabos está acontecendo
aqui?! – blasfema o Padre ao ver as mulheres na árvore - O capataz da Olho
D’água encontrou ele perto do Sítio – completa, saindo do carro e puxando a
criança.
O menino corre para o colo da mãe
ajoelhada.
No silêncio que se seguiu, poucos ouviram o cochicho desesperado entre Penha e Sargento.
- É Donizeti, agora teremos problemas! - gemeu a religiosa.
- Tamo ferrado, irmã! Amanhã tem televisão, "direitos humanos" e corregedoria infernizando a nossa vida!
No silêncio que se seguiu, poucos ouviram o cochicho desesperado entre Penha e Sargento.
- É Donizeti, agora teremos problemas! - gemeu a religiosa.
- Tamo ferrado, irmã! Amanhã tem televisão, "direitos humanos" e corregedoria infernizando a nossa vida!
FIM
Comentários
Obrigado, Lord, por seu incentivo e paciência durante esses meses.
Mas agora, me escorre uma lágrima e preciso de silêncio.