AOS MEUS NETOS >> Sergio Geia
Para João
Cláudio e Maria Alice
Era um pedaço de papel com uma mensagem de afeto
escrita à mão: “Aos meus netos: Que eu envelheça. Que na minha pele possam
surgir rugas. Mas que meu coração jamais fique indiferente ao amor. Que eu
jamais perca o poder de demonstrar um gesto de ternura”. E a mensagem de um avô
que se dirige aos seus netos termina aí. O texto é datado de 20 de março de
2013, quatro meses antes de seu falecimento. Sua filha o encontrou e o postou.
E hoje, somente hoje, mais de três anos depois, eu o encontrei.
Sua filha, a propósito, é prima do Geia; pois
ele, o avô, o autor de tão singelo gesto, é tio. E o pensamento que ele
escreveu quatro meses antes de morrer é de uma autora chamada Rachel Free.
Pois consigo imaginar a cena: quarta-feira, 20 de
março de 2013, uma bela manhã de sol, passarinhos voando, cigarras chiando,
Claudio em seu apartamento na frente do computador, lendo coisas, pesquisando
um assunto, lendo as notícias do jornal, vendo a sua caixa de mensagens, quando
se depara, depois de muito navegar, com um texto leve de uma autora de nome
Rachel, numa página de pensamentos; um pensamento que o cativa, que o emociona,
e tão forte revela-se essa emoção, a delicadeza de palavras tão honestas, e
verdadeiras, que tem vontade de copiar; pega um papel, um simples pedaço de
papel e uma caneta; mas não quer apenas copiar e deixar a anotação perdida no
fundo de uma gaveta; quer passar adiante, despertar alguém sobre a
singularidade de palavras tão fortes, e logo deita no pensamento a imagem
inocente dos netos mergulhando numa piscina; então, começa a escrever: “Aos
meus netos...”.
Imagino também que seus netos já tenham lido com
carinho e certa curiosidade a mensagem que o avô lhes deixou; até algumas
lágrimas já devem ter rolado; sim, porque até no Geia, que não é neto, mas
apenas sobrinho, espelhos de água se formaram nos olhos, e um pequeno filete
desceu até o queixo. Alguns, pela tenra idade, não devem ter compreendido nada,
mas gostado de saber que o vô, que não está mais entre eles, deixou uma
mensagem, e devem sorrir ao ler o bilhete.
Talvez lá na frente, quando forem pais, ou também
forem avós, quando os netos estiverem a correr um atrás do outro, a pular numa
piscina ou a jogar bola, eles se lembrem das palavras do vô “Aos meus
netos...”, ou não se lembrem (nem é mais preciso), porque dia a dia nessa
confusa vida, seus passos seguiram firmes na direção desse oceano chamado amor,
não economizando sequer um simples gesto ou palavra de carinho, de ternura, e
se tornaram pessoas de bem, amorosas, solidárias, preocupadas com o semelhante,
atentas às necessidades do outro e às vicissitudes da vida, semeando amor, paz,
compaixão, guiadas por um despretensioso bilhete escrito à mão, com traços
elegantes e firmes, numa manhã clara de março de 2013.
P.S.: Obrigado, amigo leitor, por me acompanhar
em 2016; que o Ano Novo seja repleto de muito amor e grandes realizações.
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Um abraço!