NA PROFESSOR MOREIRA >> Sergio Geia




No 327 da Professor Moreira existe um prédio largo, vistoso, com muitas janelas, pintura nova, piso de granito, flores, jardim e um brasão. Na frente, um letreiro informa de que se trata tão pomposo imóvel: Mitra Diocesana de Taubaté.

Há uma mesa logo após a porta de entrada, uma funcionária bem vestida carrega pastas; deve cuidar da burocracia da igreja. Há também uma placa, um pouco menor, com o horário de funcionamento: das 8:00 às 12:00 horas e das 13:00 às 17:00 horas; uma boa garagem; grandes portões cerrados.

Lembro-me de que ali funcionava um pensionato de freiras, cujos quartos, amplos e aprazíveis, eram alugados para moças estudantes que chegavam a Taubaté, atraídas por faculdades. Ali encontravam um teto decente; para pais e família, decente e gerenciado por freiras, o que é bem melhor.

O prédio fica numa região privilegiada, com fundos para a Professor Moreira e frente para a Praça Santa Teresinha. A poucos metros dali está a faculdade de medicina, a faculdade de educação física, a faculdade de comunicação social e a faculdade de fisioterapia. Com um pouco mais de esforço, mas nem por isso longe, chega-se ao campus da Ecase, onde funcionam as faculdades de economia, contabilidade, administração e odontologia, de modo que o lugar, além de bem gerenciado, situa-se num ponto favorável da cidade para quem vai frequentar faculdades.

Foi com tristeza que vi aquela casa jovial e alegre de outrora, frequentada por moças bonitas e felizes, ser transformada de uma hora para a outra numa sem-graça Mitra Diocesana de Taubaté, e no seu vai e vem de padres.

Recordo-me de que sempre tinha algo bom de ver por detrás daquelas janelas. Eram divertidas as moças, além de graciosas, e regularmente havia conversa fiada quando estavam a espiar a rua. Certa vez executamos uma serenata que foi muito bem recebida por elas, até que uma das freiras, mal-humorada que só vendo, tratou de nos pôr pra correr. Pois hoje sei que vou olhar pra cima e nada verei além de pobres janelas mortas, quando muito um padre idoso plantado num daqueles aposentos com história.

Mas a vida é assim, o que se há de fazer? Outro dia foi o Colégio Anchieta, que vi parte no chão. A Villa Santo Aleixo, dizem que sai reforma. Na Professor Moreira mesmo, no 267, hoje existe um comércio. Pois ali moraram os Castilhos, nobre família da cidade e meus amigos de longa data. Frequentava aquela casa e sempre fui acolhido como filho. Às vezes víamos filmes. Outras, jogávamos detetive ou truco. Ou corríamos ao centro atrás de propaganda comercial para o serviço de som da igreja.

Eram tempos de vadiagem; bons tempos. Vejo que a saleta da residência dos Castilhos se transformou num abafado escritório. Naquele mesmo lugar de tantas histórias, espio um rapaz perguntando o preço de um seguro qualquer. Saio de lá com aperto no peito.


P.S.: foto da rua Professor Moreira, em Taubaté

Comentários

paulo pereira disse…
Vou discordar de você. Prefiro um belo Museu de Arte Sácra a um mosteiro com donzelas pudicas e freiras rigorosas demais.
Eu acho que fui o único homem a adentrar naquele recinto. Foi profissionalmente.
Uma aluna da medicina estava adoentada e precisou de meus cuidados. Foi um fato inusitado que criou muitos arrepios.
Zoraya disse…
Belíssima crônica memorialista, Sergio! Tocante e delicada. Tá virando especialista.
sergio geia disse…
Dr. Paulo Pereira, não discordamos; ao contrário, concordamos. Obrigado por compartilhar dessa lembrança. Grato mais uma vez, Zoraya.
Sergio, até eu fiquei com aperto no peito. Bela crônica!
Sylvia Testa Braga disse…
Meu querido sempre brilhante nas crônicas.
Gostei muito do que li.
Voltei no tempo. Foi muito bom.
Morei na Professor Moreira pegado a casa da vó Laurenca minha
Tia irmã de meu pai.
Você me fez voltar ao passado e lembrar de tudo.
Pensionato. Irmãs e alunas que ali moravam para estudar.
Obrigada querido. Foi muito bom relembrar tudo.bjos no seu
Coração.

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