O ÍNTIMO DAS COISAS >> Eduardo Loureiro Jr.

As coisas também têm seu íntimo.

Antigamente, eu me sentava aqui, ou acolá, e escrevia uma crônica em vinte minutos, assim como quem abre a torneira e a deixa aberta enquanto escova os dentes ou faz a barba. Era uma mistura de crença na abundância com tolice despreocupada.

Hoje não é bem assim. Hoje eu me pergunto se devo mesmo abrir a torneira. Já tem tanta água desencanada por aí. Eu mesmo, se empregasse todos os meus dias lendo aquilo que quero ler, não daria conta em uma simples encarnação. Então para que acrescentar mais palavras a esse mundo? Não seria a palavra, assim como a água, um bem a ser preservado, a ser utilizado com parcimônia?

Tem dias em que sinto vontade de ficar parado, bem parado, e só espreitar o movimento de tudo ao meu redor. O passeio do Sol bem que merecia um espectador atento que aplaude só no final. Mas existe o íntimo das coisas, e, entre as coisas, eu mesmo.

Meu íntimo é um labirinto de canos percorrendo paredes, subsolos, desaguando em canos maiores, também labirínticos, até o mar, esse labirinto absoluto de água sem necessidade de canos.

Antigamente, eu escrevia qualquer coisa e a publicava assim como quem mostra uma nova maravilha para a mãe coruja. Hoje aperto o botão PUBLICAR quase com vergonha de estar desperdiçando palavras.

Comentários

Albir disse…
Não é desperdício, é distribuição, já que nós as recolhemos. Continue generoso. Sabemos que você tem muitas e boas palavras.
Analu Faria disse…
Que delícia de crônica!
Grato, Albir e Analu, pela generosidade em relação às minhas palavras. :)
Lilu disse…
Que bom, Lindo, que você compartilha seus encanamentos, mesmo com declarada economia de si.
Que suas águas sigam fluindo, indo, vindo. Ares e marés de si ofertados.
Eu só agradeço.

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