FINAIS >> Eduardo Loureiro Jr.

"Nem tudo que acaba aqui
deixa de ser infinito."
(Zélia Duncan / Edu Tedeschi)

Eu gosto de finais. Mas não de alguns finais.

Houve uma época em que eu tinha vontade de sair do cinema sempre um minuto antes do filme acabar. Eu tinha a sensação de que os diretores não sabiam concluir os filmes, que terminavam sempre depois do ponto ideal.

Não, eu não tenho nada contra finais felizes, até gosto muito do "viveram felizes para sempre", mas de vez em quando acho que se força um pouco a barra. Para a alegria ou para a tristeza.

O final não pode ser fruto de "um jeitinho", o final tem que estar de acordo, concordar, de coração, com a história. Isso não quer dizer que não possa ocorrer uma reviravolta no final. O final mais impactante que já vi tem uma grande reviravolta. E o personagem, na cena final, não se parece em nada com o personagem durante todo o filme, mas pra mim é impensável que o filme pudesse terminar de outra forma.

Vejam por vocês mesmos o final de "Perdas e danos", um filme fortíssimo em que um político famoso se envolve com a noiva do próprio filho. O caso é descoberto, o filme poderia ter acabado no final trágico, mas termina assim:

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Revendo agora, penso que o diretor não precisava ter ido tão longe. Teria sido mais perfeito se ele interrompesse o filme na hora em que o personagem está cortando o queijo ou, no máximo, quando ele começa a abrir a janela. É que, na minha memória, eu havia ficado só com isso: com a paz depois das perdas e danos, com a paz de um queijo sendo cortado sobre uma mesa simples, dentro de um quarto simples, por um homem simples.

Não deve ser coincidência o fato de que o meu final preferido pertence ao meu filme preferido: "Tempos Modernos". Nesse final estão toda a dureza e a dificuldade que aparecem durante o filme, mas está também, e sobretudo, a esperança no futuro.

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Para mim, os finais não são finais: eles são um fio de continuidade. O final mantém nossa ligação com a história mesmo depois que as luzes são acesas ou que o livro é fechado. O final eterniza o que poderia ser passageiro. Por isso a tristeza de um final perfeita e adequadamente triste é tão luminosa quanto a alegria de um final perfeita e adequadamente alegre. Mesmo o final suspenso, o final sem final, é o melhor que existe quando é perfeito e adequado.

Porque o final, quando é preciso, exato, faz com que a gente continue acompanhando os personagens em nossa imaginação. A gente consegue imaginar o que é ser feliz para sempre, ou então fica torcendo e rezando para que o personagem consiga ser feliz depois de um final que tinha de ser triste.

De vez em quando, penso em que aventuras estão metidos o vagabundo e sua musa. E quando percorri as ruas estreitas e de pedra de algumas cidades italianas, fiquei imaginando encontrar o ex-político que corta queijo com simplicidade.

Espero que também você esteja começando a imaginar o que será de mim depois desta crônica. Porque eu já estou com aquela sensação de que estou demorando demais pra colocar o ponto final.

Comentários

Unknown disse…
edu-ARDuO?!
;o)

No meio da leitura dessa sua poesia - que é crônica, me lembrei das palavras de Quintana:

"Reticências? São apenas o início de um novo caminho que se inicía por si só...sozinho!"

Assim continuei a partir do próximo parágrafo...e enquanto isso...com a Flor de Lis no Peito (LISPECTOR) ergo um brinde à vida..."que há pra ser vivida"...
pq eu mesma? Não tô nem um pouco interessada em abreviar,o tal do Ponto Final!
Tia Monca disse…
Junoca,
O palpite, que me tranquiliza, é que chegou a hora de colocar um ponto final na Sra Tristeza :o)
Agora é só alegria.....
Até semana que vem,
Bj,
Tia Monca
Eduardo, eu sempre achei que final perfeito é aquele que faz com que a gente fique imaginando a continuidade do filme ou livro. E você traduziu isso em "A gente consegue imaginar o que é ser feliz para sempre, ou então fica torcendo e rezando para que o personagem consiga ser feliz depois de um final que tinha de ser triste."
Que seus finais sejam sempre o início de momentos felizes! :)
Petra, que bom você ter vindo e trazido Quintana e Clarice.

Tia, adoro meus leitores otimistas. :)

Marisa, quer dizer que eu continuo roubando seus pensamentos? :)
Eduardo,
Tenho a dizer que você continua com essa mania...Mas sossegue, garanto que meus pensamentos foram honestamente roubados...:)
Carla S.M. disse…
Ai, lembrei-me do final de "O Labirinto do Fauno". Se prestar atenção, vai ver que ao invés de terminar o filme com a cena feliz de Ofélia no mundo da fantasia, virando princesa, Del Toro termina mostrando o último suspiro de Ofélia no mundo real.
E eu sempre me perguntei... mas por quê???
(...)Que nenhum final seja para sempre... bjs
Juliêta Barbosa disse…
Ah, Eduardo, este seu texto sobre finais chegou em 'tempo de despedidas' na minha vida... Nada mais apropriado. Ando me perguntando: e agora? Obrigada, por partilhar pensamentos e palavras tão sensatos.
Carla, acredita que só vi o Labirinto do Fauno essa semana? E não foi o final que me chamou a atenção: foram as tramas paralelas que me deixaram tonto, de labirintite. :)

Juliêta, que em seu "tempo de despedidas", os finais sejam abençoados. :)

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