APAREÇA NO TREM >> Sergio Geia

 

Você pode terminar de ler esta crônica e pensar, ah, mas eu já vi isso, alguém já fez, o Geia está copiando uma ideia, e para querer desafiar o Geia pode até entrar no Google, pesquisar, buscar crônicas, cronistas, textos do passado, provas. 
 
Não perca seu tempo. Você tem razão. Eu assumo. A ideia desta crônica alguém já teve. E foi um de nossos melhores cronistas, aquele a quem sempre que posso reverencio, minha referência máxima ao lado do Braga, e que sempre tem um lugar de destaque em meus textos e livros: Caio Fernando Abreu. Você vai achar semelhanças com Venha ver os dragões, publicada em 25/3/1988, em O Estado de São Paulo, em que o autor fala do lançamento do seu livro Os dragões não conhecem o paraíso; e Autógrafos, manias, medos e enfermarias, publicada em 23/7/1995, no mesmo jornal, para falar do lançamento de Ovelhas Negras
 
Tarde/noite de autógrafos é um caso sério. Escritores famosérrimos, como Lygia, Scliar e o próprio Caio, sofriam com a fantasia de ausência de gente no lançamento. Caio tinha verdadeiro pânico com o simples pensamento de ficar plantado em uma livraria deserta esperando os leitores, perdido feito pastor no meio de um rebanho de ovelhas desgarradas. 
 
Imagine um escritor desconhecido? Pânico, terror e aflição, diria Elba. 
 
Vocabulário de memórias ausentes é meu terceiro livro. Pela primeira vez estou publicando sem gastar um centavo. A Carla Dias e o Whisner Fraga leram os contos, gostaram, decidiram, e a Sinete assumiu o projeto; alegria sem fim. 
 
Todas as histórias do livro são ficcionais. É claro que quando o escritor cria uma história, ela tem muito de sua memória, de acontecimentos que ele presenciou, de pessoas que ele conheceu, de situações que ele vivenciou. 
 
Há uma personagem no conto A menina da praia, por exemplo, que rege uma orquestra imaginária com um pauzinho de sorvete. O conto é ficcional, mas essa personagem eu tenho na memória, pois na minha infância, conheci uma moça que andava pela rua de minha avó regendo uma orquestra imaginária com um pauzinho de sorvete. Há outros exemplos, mas deixo esse apenas como um aperitivo do que você irá encontrar no Vocabulário: 
 
Quando pensava em se mandar, diante da agonia daquele silêncio, ela se levantou, estapeou o vestido para libertá-lo das areias acumuladas e veio em sua direção. Ao se aproximar, examinou-o de cima a baixo, olhos vívidos, verdes, como se lhe arrancasse um catálogo da alma — ele sentiu um arrepio. Depois, os olhos murcharam. Ela começou a cantarolar uma melodia estranha. Na mão direita, um pauzinho de sorvete era meneado ao vazio. Em seu mundo, ela regia uma orquestra imaginária. 
 
Na pré-venda fui à luta, conversei com pessoas, falei do livro, mandei mensagens via WhatsApp, áudios, vídeos, virei o amigo chato; muitos não deram bola, outros não devem ter gostado, talvez alguns até me bloquearam, reclamaram, o Geia agora só fala disso. Duas semanas antes do lançamento, mandei convites virtuais, falei de novo, insisti. E novamente estou aqui, falando, insistindo; perdão. 
 
O lançamento acontece hoje, no Trem Azul, a partir das 17h. E quem fala agora é o escritor desconhecido, com medo de virar pastor de ovelhas desgarradas vendo o trem azul passar. 
 
A noite será de alegria e para celebrar o livro, apenas ele. Confraternização com aqueles que já compraram, com os que irão comprar, e este autor que ama escrever histórias. Apareça no Trem. E mais importante: leia o Vocabulário, e depois me conte. Prometo que após às oito tomo umas com você. 
 
 
 
Ilustração: Pixabay

Comentários

Jander Minesso disse…
Medo é bom. Um pouco de medo, pelo menos. Faz a gente lembrar que está vivo. Mas apareçam dois ou duzentos no lançamento, o Vocabulário é sucesso, meu caro. Pode dormir tranquilo!
Nadia Coldebella disse…
Não estarei, vc sabe, lonjão pra caramba, mas te desejo muito sucesso, muitos autógrafos e nenhuma solidão!
Zoraya Cesar disse…
Também nao pude estar, mas espero que tenha sido o sucesso maravilhoso q vc merece. E estou esperando meu exemplar autografado!
Albir disse…
Tenho certeza de que foi um sucesso! Não pude ir, mas aguardo ansioso o meu exemplar, em que Carla teve a doçura de conseguir o seu autógrafo.
Abraço, parabéns!
sergio geia disse…
Gratidão, amigos. Foi uma tarde/noite especial.

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