A FOME MORA AO LADO >> Sandra Modesto
O domingo entrou pela manhã. Sara saiu pela porta em busca de algo.
Lia era uma menina, mas já sabia algumas vezes do ruído espaço.
Mãe e filha sempre se comunicavam... Pelo olhar, o silêncio e as conversas das coisas.
Na mesa surrada a toalha sobrava quase arrastando pelo chão. Sara e Lia construíam o cenário transmutado.
O pão já não estava por perto. O preço do pão, pela hora da morte. O salário estreito.
E o adeus ao pão no café da manhã. Restavam então as folhas de erva cidreira no quintal. O cheiro do chá era o poema sem rimas de Sara e Lia.
Nas vezes em que o medo dava sinal, o diálogo pedia passagem.
Ao meio dia o almoço seguia a passos lentos.
Comer e assuntar o desmanchar da fartura de outrora. Tudo virou susto...
O preço do arroz. O preço do feijão. Aquele prato feito tão perfeito, não cabia mais.
Macarrão?, pergunta a mãe.
Pode ser, responde a filha.
O paladar escorria sem gosto, estranho, sem molho de tomate.
Quando chega o fundo da noite, Lia olha para o céu. Sara abraça a filha.
Mas tudo já está diferente.
Quando a gente percebe.
Já é fogo.
“De todos os problemas sociais o mais grave é a fome. Porque envolve uma série de questões”A autora.
Mas isso é assunto para outra crônica.
Comentários
A frase “Tudo virou susto...” me tocou muito!