Sobre fogueiras, tolos e fotos >>> branco

Ontem teve uma festa muito bonita na pequena cidade de Cachoeira de Minas, a "Festa da Fogueira", fogueira que, segundo o anunciador oficial, é a maior do mundo. Peguei meu carrinho e lá fui eu e a sagrada família, chegamos na cidade, onde tenho alguns amigos, por volta das sete e meia da noite, ainda tinha pouca gente.

Como turistas que somos, fotos, fotos e mais fotos ou modernizando a linguagem, selfies, selfies annndddd selfies. Entre um lanche e outro, os refrigerantes (as bebidas alcoólicas foram abolidas por minha democrática ordem), no máximo um copo de vinho quente para cada um, tomei metade.

Bem, ficamos rodeando e  dando voltas pela cidade, e claro, observei muitas pessoas; orgulhosas pela festa, orgulhosas pela fogueira  que estava montada no imenso pátio no alto do morro. Ela é realmente grande, bonita e imponente (mais de 30mts de altura), mas nada se compara com as pessoas, andando de lá pra cá e cá pra lá, notei que as botinhas de camurça são a solução para aquecer os pés no inverno, tanto dos homens quanto das mulheres, cada pessoa usava um par delas, raramente uma mulher de sapato de salto alto aparecia e se aparecia, destoava : "Aquele sapato (ou seria sandália) em uma noite de inverno e no chão de terra batida?". Mas é importante repetir e repetir, todos tinham o maior orgulho, a maior alegria por estar ali; percebia-se uma paixão pura, pessoas entusiasmadas, pela fogueira, pela festa, pelo acontecimento.

Um velho sábio desta mesma cidade me disse uma vez: "-Tenho inveja dos tolos!". Hoje não tem inveja de mais ninguém, morreu há tempos.

Mas, voltando ao ambiente da festa, um pátio imenso, barracas com lanches, doces, cachaças, cervejas, vinho quente, quentão e outras com brinquedos : o girocóptero agora com luzes de led, os balões de ar, as rotineiras marionetes de  fantasminhas com seus olhos piscantes, muita coisa, muita alegria, muita felicidade.

Onze da noite (foi, é e será), a importante hora em que todos que estavam na cidade sobem juntos o morro íngreme e longo para chegar ao pátio onde já estávamos. Em sincero, era gente que não acabava mais, um dos que estavam perto de mim chegou a dizer que tinha mais gente que na festa do  carnaval de São Luiz do Paraitinga.

Mas o importante é voltar a falar das pessoas, da paixão, da alegria e de como coisas tão "pequenas" como uma festa e uma imensa fogueira podem fazer uma pessoa sentir-se o maior dos seres humanos, e que se diga : sem prepotência. Apenas aquela alegria boa, palpável, genuinamente tola e que o sorriso na boca não deixa qualquer duvida sobre a felicidade íntima.
Meia noite e o grande momento, após shows e mais shows de musica, finalmente a fogueira foi acesa: 

"Que coisa linda!", ainda mais linda, pelos reflexos nos olhares admirados, nos dentes da boca aberta em delírio, nos gritos de incentivo ao fogo e tudo o que acontece em um "pequeno" acontecimento que, por acaso, é o da "maior fogueira do mundo", tiramos fotos, fotos e mais fotos (éramos turistas, lembram?).

Fiquei olhando a fogueira queimar, me perdi (dentro dela) em pensamentos, em outras fogueiras que aos poucos foram queimando alegrias, retratos internos, restando apenas visagens, cinzas e fuligens, daquelas que os limpadores de pátios e calçadas não conseguem retirar.

Pintei um falso sorriso na cara e nestes tempos de redes sociais, resolvi não postar nada.

Relembrei a frase do velho sábio.

Viemos embora pouco depois.



30 de junho de 2019






Comentários

Salete Ortiz disse…
Que lindo ! Me fez chorar.
Anônimo disse…
Fez me sentir como se estivesse lá! Maravilhoso!
Carlos Eduardo disse…
Apesar das virgulas, pontos, exclamações e interrogações e o fato de ser uma crônica, na acepção da palavra, nada disfarça que é uma coisa sua poeta.Li, reli e tornei a ler. A mágica dos opostos e no final a dúvida, quem é o sábio, quem é o tolo? O preço, o consumo da sabedoria. Sutil e brilhante como sempre.
Anônimo disse…
Incrível, eu estava lá, naquela fogueira ,senti o calor dela e vi as pessoas passeando de um lado ao outro. Que sensação. Valeu o passeio
Rafa Calil disse…
Adorei! Obrigada pela leitura.
Vera Priante disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Vera Priante disse…
Me senti o meio daquelas pessoas...Belo texto...
Marcelo Belo disse…
Incrível capacidade de sintetizar tamanha riqueza de detalhes, proporcionando um verdadeiro transporte D'alma... Adorei estar nesta fascinante festa!
Anônimo disse…
Que festa maravilhosa, amei estar nela!
branco disse…
esta foi a minha primeira tentativa de fazer numa crônica. em sincero, era do meu desejo que ela saísse linda, linda como um sorriso no rosto de alguém que olha para o sol. pelos comentários. e sem falsa modéstia, acredito que consegui. estou feliz como uma pessoa se aquecendo ao lado de uma fogueira com um bom vinho à mão, e eu brindo à todos vocês.
branco
Zoraya Cesar disse…
Pois olhe, Branco, seu desejo foi atendido. Nada impede que uma crônica seja poética nas entrelinhas. Rubem Braga e Sergio Geia que o digam.
A sua me fez leve. Obrigada.
Albir disse…
Também não escapei da nostalgia da sua fogueira. Alegria quase doída de saudade.

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