NO MUNDO DA LUA >> Albir José Inácio da Silva
Há cinquenta anos, em meio a
chuviscos e ruídos da tv a preto e branco, o homem pisou na lua, mesmo que
alguns não tenham acreditado e até hoje não acreditem.
Mas aquelas imagens não assombraram
meus olhos infantis, habituados que estavam à série “Perdidos no Espaço”,
narrativa pródiga em cenas de planetas distantes, espaçonaves e extraterrestres
amigos ou inimigos.
A nave em que viajavam – Júpiter II
– era mais avançada que a Apolo 11. O painel, entretanto, era decorado com
lâmpadas coloridas, de bulbo – dessas que já não se fabricam mais.
A realidade imitando a ficção
ajudavam a me manter no mundo da lua e eu aterrissava raramente e só de passagem
pelo ano da graça de 1969. Enquanto o mundo assistia, além da alunissagem, ao recrudescimento
da guerra do Vietnã, ao Festival de Woodstock e ao horror do assassinato de
Sharon Tate pela família Manson.
No Brasil também, enquanto se
comemorava o feito norte-americano, um “grande salto para a humanidade”, e voávamos
nas asas da ficção das telenovelas, a realidade endurecia. Em dezembro de 68 tinha
sido baixado o AI-5, que dispensa apresentações.
Na esteira vieram a Lei de
Segurança Nacional, a Emenda Constitucional número 1 e a posse de Garrastazu
Médici, o mais sanguinário dos generais ditadores. Também nesse ano foram
suspensas as eleições para governadores e prefeitos, o embaixador americano foi
sequestrado e, no quesito pão e circo, comemoramos o milésimo gol de Pelé.
Éramos só alegria.
“Perdidos no Espaço” voltou em
filme de 1998 e agora, em 2018, em novas temporadas, mas a minha infância ficou
perdida lá com os primeiros voos da Júpiter II. Depois vieram trabalho, cartão
de ponto, chefes, salários e dívidas. A cabeça ficou presa no trânsito, mas às
vezes o coração me leva de volta às lâmpadas de bulbo que piscavam no painel.
O projeto Apolo parou em 1972 e o
homem não voltou mais à lua. Há planos, informa a NASA, de regressar ao
satélite em 2014, mas o orçamento está curto porque precisam fabricar muitas
bombas para novos Vietnãs.
No Brasil a ditadura acabou em
85. Em 88 tivemos constituição cidadã e então alguns avanços.
Mas há quem peça a volta da
ditadura, aplaudindo ameaças de tortura e liquidação dos diferentes. Espero que dessa vez não consigam, embora já
tenha ouvido rumores sobre terraplanismo, geocentrismo, fogueiras, masmorras e DOI-CODIs.
Temo que hoje não tenha mais energia e coragem
para manter viagens paralelas por mundos estranhos enquanto as coisas pioram
por aqui. Naquele tempo eu era menino. Há
cinquenta anos.
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