FALTA O QUÊ? >> Albir José Inácio da Silva
Na iminência da prisão de um ex-presidente
e dos presidentes da Câmara, do Senado e do Partido, manobra-se agora para
salvar couros, mandatos e reputações . As ruas não ajudam: emudecem as panelas
- assombradas com o monstro que criaram - e grita-se não ao golpe.
Tem pressa o golpe. Sabe que é
insustentável do ponto de vista da legitimidade, mas precisa desmontar algumas
políticas públicas alçadas ao patamar constitucional. É um braseiro. A cada
medida desmanteladora, a grita nacional e internacional obriga ao recuo do temeroso
e assustado interino.
Ele recua quando gritos e vaias
impedem seu deslocamento pelo território nacional, mas volta à carga quando
silenciam. É longa a pauta de desmonte e ele vai tentar impor o máximo que
puder.
Foi assim com o ministério da cultura,
considerado perigoso por promover a temida cultura – sempre um entrave ao golpe
pacífico e eficaz.
Para a secretaria de mulheres foi
uma mulher contrária ao aborto em casos de estupro, num perigo de retrocesso de
setenta e seis anos, já que essa proteção à vítima foi contemplada no Código
Penal de 1940.
De resto, as mulheres foram
excluídas do ministério porque o machismo as quer belas, recatadas e do lar.
O ministro do trabalho quer
flexibilizar a CLT, ameaçando conquistas desde Vargas, para agradar
empresários, impondo salário menor com a terceirização e recolocando as
empregadas domésticas no seu “devido lugar” – o que atende à vontade das
“panelas” hoje silenciosas.
O ministro da saúde, cuja
campanha para deputado foi financiada pelos planos de saúde, promove o
desmantelamento do SUS e do programa mais médicos por motivos óbvios demais
para serem expressos.
Contrário às cotas e ao ensino
público e gratuito, o ministro da educação ouve escolas particulares e atores
pornô.
Na pasta da justiça, o titular é
contra movimentos e manifestações por justiça social, que ele chama de atos de
guerrilha. Enquanto isso, um policial condenado, preso, solto, aposentado com
fraude, reintegrado, vaza informações sigilosas, é recondenado, represo,
ressolto, continua trabalhando e prendendo pessoas, usando, ele próprio, tornozeleira
eletrônica.
Alguém poderia argumentar que ainda
faltam fundamentalistas, racistas e homofóbicos nas secretarias de promoção de
igualdade religiosa, racial e de gênero. Mas até quando?
Falta, isto sim, para brindar esse
momento triste de nossa história, a frase com que Jarbas Passarinho abençoou o
AI-5 em tempos igualmente sombrios.
Passarinho morreu na semana
passada, mas os quase-presos por corrupção e o presidente interino, condenado e
inelegível, parecem declamar em uníssono jogral:
- Às favas todos os escrúpulos!
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