INVENÇÃO E SILÊNCIO >> Cristiana Moura
Vez por outra acontece: de tanto ficar dentro de si mesmo,
se esvazia de mundo. É assim desde a época de menino lá no seu interior.
Enquanto os garotos jogavam bola, haviam períodos que parecia mesmo um retiro.
Ele ia subir em árvore e chupar caju. Sempre sem companhia. Precisava de
solidão. Mas não era um estar só qualquer. Era coisa de solidão povoada.
Enchia-se de si mesmo. Ele lhe era a melhor companhia. Passada a época do caju,
voltava a andar com os outros garotos, jogar bola e tudo o mais.
Até hoje é assim. Homem feito. Amores, filhos. Caio se inventa nesta solidão sazonal. Afasta-se dos sons do mundo e no silêncio parece ouvir a si mesmo e a algo maior. Ontem eu o vi. Era uma tal serenidade que lembrei-me do trecho da música de Gil: "Se eu quiser falar com Deus, tenho que ficar a sós...” — deve ser seu mantra.
Depois do seu exílio voluntário, a volta ao
mundo sempre causa estranhamento. Sente uma gastura na pele como se olhares e
sorrisos, ao mesmo tempo, o invadissem e acolhessem. Ele esboça um sorriso para
o qual não encontro adjetivo. É fruto de alegria serena que só se cultiva em
recolhimento. É alegria de quem se contenta com a vida. Nem mais, nem menos. O
homem é o que é. Aos poucos vai se enchendo de afetos doces em rever os amigos.
— Quanto tempo , meu amigo, andava sumido! Já havia se acostumado com estas
exclamações. Cumprimenta os amigos com abraços, afetos e silêncio. Até hoje é assim. Homem feito. Amores, filhos. Caio se inventa nesta solidão sazonal. Afasta-se dos sons do mundo e no silêncio parece ouvir a si mesmo e a algo maior. Ontem eu o vi. Era uma tal serenidade que lembrei-me do trecho da música de Gil: "Se eu quiser falar com Deus, tenho que ficar a sós...” — deve ser seu mantra.
Há quem diga que ele é estranho. — Lá vem o Caio, aquele seu amigo esquisito — dizia a moça de vermelho. Mas não. Caio é presença e solidão. Ele parece cuidar do tempo, como quem reverencia a um Deus. Se é que vivemos mesmo muitas vidas em encarnações diferentes, ele vive muitas vidas em uma só. Quando ele ressurge, reinventado, aguardo seu abraço mudo e pleno e me reinvento também. Fico aqui imaginando como seria se cada um de nós encontrasse esse silêncio e pudesse ouvir para além dos ruídos do mundo.
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