A ÚLTIMA >> Kika Coutinho
O último beijo. O último pedaço do doce, o último par de sapato (no marrom, 37), a última gravidez, o último amor. Todos os últimos carregam consigo alguma melancolia. Até a última bolacha do pacote, ainda que esteja um pouco mole, posso apostar, terá sempre outro sabor. Tem impressa naquele final algo um pouco simbólico, como se ali cerrasse uma oportunidade; ali cravamos um momento único, porque ainda que outro pacote esteja na prateleira — é outro pacote. Aquela era a última.
Há sempre certa dor no último, certa melancolia no final, muitas lágrimas na despedida, muita tristeza no que se acaba, mesmo que os dois tenham escolhido seguir caminhos alternativos.
Quem não chorou numa separação, por mais amigável que tenha sido? Quem não sentiu os lábios trêmulos ao dizer adeus, ainda que a escolha tenha sido acertada, quem é que não engoliu em seco quando fechou a porta, um aperto fino no peito, uma moleza súbita nas pertas, o coração se esfacelando contido, em mil pedacinhos. Um estouro silencioso dos vidros internos, uma dor sem nome, é a vida, sempre se acabando quando recomeça...
Foi num dia de calor quando o Eduardo, dono desse site, me convidou a escrever aqui. Senti um orgulho indisfarçável, flutuei de alegria, talvez por dias consecutivos, como se uma névoa de afeto me carregasse. De lá pra cá foram muitas, inúmeras crônicas até que, alguns dias atrás, enfim, pedi ao Eduardo que disponibilizasse esse espaço para algum dos tantos talentosos escritores que ele conhece. Não foi sem dor que o fiz, ao contrário. Como numa separação, senti-me um pouco bamba, um bocado sem fôlego, a voz embargava quando pensava no assunto e, ainda assim, tinha a convicção de que me era necessário fazê-lo. Nada de dramático aconteceu, nenhum sinal no céu, nenhum armagedon — como diria Gil. Não, é apenas a vida, o tempo, as escolhas, o foco, a idade, a dieta, os filhos, o marido, o calor, o trânsito, um bocado de cansaço e o trabalho. Ah, o trabalho...
Abandono este espaço cheia de gratidão, cheia de saudade e certa de que não caibo mais aqui, não caibo mais na escrita, talvez ela nunca tenha sido pra mim, mas uma transbordamento irremediável mantinha minhas mãos teclando, semana após semana, como se disso fosse feita a vida, de palavras que, bem agrupadas, faziam um texto. No entanto, não é. A minha vida é feita do trabalho que me sustenta, da minha família, de tijolos e cimento, uma casa como aquela segura, a do terceiro porquinho.
Essa é a minha última crônica e não terminarei a minha fugaz carreira de escritora com adeus, com tchau, nem mesmo com o batido “até logo”. Bem eu que sou tão apegada às palavras, aos sinônimos e ao vasto vocabulário de nossa língua, agora vejo-me quase vazia porque tenho muito pouco, pouquíssimo, quase nada a dizer. A verdade é que, de repente, noto que a única palavra que me vem em mente ao despedir-me desse espaço, desse tempo, e dessa sensação, é simples, tola, quase que usual, mas posso assegurar, poucas vezes a usei com tanto significado e verdade: Obrigada. Profundamente, obrigada.
Foi num dia de calor quando o Eduardo, dono desse site, me convidou a escrever aqui. Senti um orgulho indisfarçável, flutuei de alegria, talvez por dias consecutivos, como se uma névoa de afeto me carregasse. De lá pra cá foram muitas, inúmeras crônicas até que, alguns dias atrás, enfim, pedi ao Eduardo que disponibilizasse esse espaço para algum dos tantos talentosos escritores que ele conhece. Não foi sem dor que o fiz, ao contrário. Como numa separação, senti-me um pouco bamba, um bocado sem fôlego, a voz embargava quando pensava no assunto e, ainda assim, tinha a convicção de que me era necessário fazê-lo. Nada de dramático aconteceu, nenhum sinal no céu, nenhum armagedon — como diria Gil. Não, é apenas a vida, o tempo, as escolhas, o foco, a idade, a dieta, os filhos, o marido, o calor, o trânsito, um bocado de cansaço e o trabalho. Ah, o trabalho...
Abandono este espaço cheia de gratidão, cheia de saudade e certa de que não caibo mais aqui, não caibo mais na escrita, talvez ela nunca tenha sido pra mim, mas uma transbordamento irremediável mantinha minhas mãos teclando, semana após semana, como se disso fosse feita a vida, de palavras que, bem agrupadas, faziam um texto. No entanto, não é. A minha vida é feita do trabalho que me sustenta, da minha família, de tijolos e cimento, uma casa como aquela segura, a do terceiro porquinho.
Essa é a minha última crônica e não terminarei a minha fugaz carreira de escritora com adeus, com tchau, nem mesmo com o batido “até logo”. Bem eu que sou tão apegada às palavras, aos sinônimos e ao vasto vocabulário de nossa língua, agora vejo-me quase vazia porque tenho muito pouco, pouquíssimo, quase nada a dizer. A verdade é que, de repente, noto que a única palavra que me vem em mente ao despedir-me desse espaço, desse tempo, e dessa sensação, é simples, tola, quase que usual, mas posso assegurar, poucas vezes a usei com tanto significado e verdade: Obrigada. Profundamente, obrigada.
Comentários
obrigado por todas as suas crônicas até aqui. Lamento que esta seja a última dessa fase. Mas consolo-me com a esperança de que seja mesmo até breve. Beijos.
Eu é que tenho que agradecer por tão bons momentos ao ler suas crônicas e por muitas vezes, me encontrar nelas.
Beijos!