JURAMENTO >> Carla Dias >>
E recriar amiúde desalentos para que não falte matéria-prima aos poetas e aos autopiedosos.
Juro que sucumbirei aos sorrisos a cada recorrente espasmo de desalegria, transformando a prostração - oriunda do avassalador desconcerto de quem nada sabe sobre si que dirá sobre o outro – no primeiro passo da dança tão aguardada. Mas que fique registrado que as desalegrias enfeitam o chapéu da intensidade, assim como a sua antagônica companheira:
A alegria de enxergar de olhos fechados as margens do corpo, as bordas do espaço, a mansidão da respiração. O vazio instalado em meio às multidões.
Juro não deixar de dar de comer e de beber aos sonhos, e os cuidarei ainda que tenha de niná-los à escuridão do sentir dos carcereiros que se divertem apregoando um poder que jamais desejei ter. E a cada sonho darei um nome que me lembre os que me esperam lá fora, depois das orlas, acima dos templos, nas beiras dos afagos.
E que vou vasculhar cada canto nu em busca da veste que caiba nesse coração que é meu, mas que às vezes me parece do mundo, vagabundeando nas mãos dos amores vãos, bancando o dândi, o entendido, o que se safa e sofre escondido para não alvejar de discordâncias e incômodos os que o cercam.
Juro materializar o amor sempre que possível: gestos, oferendas, dedicatórias escritas em guardanapos, lágrimas na nuca acompanhadas de beijos. Amparo no abraço, candura nas palavras, a fraternidade da companhia. E pontes para aprender a atravessar lonjuras.
Eu juro cada juramento e mais de uma e duas e três vezes. Nem sempre de forma solene, às vezes gargalhando baixo. Juro pela umidade das coisas-sentimento, pela rivalidade entre quem sou e o que sinto, pela camaradagem entre as dores e a infância de quando ainda sequer pensava em construir a mim, do tijolo ao tombo... Do tombo ao voo... Do voo ao desalinho... Do desalinho à catarse.
Comentários
Oriane
JURO que te saber vivendo no mesmo tempo/espaço/fragilidade humana q eu...vale cada um dos teus juramentos.
E juro, sobretudo, que VALEU e SEMPRE VALERÁ renascer - após a morte - de cada sonho que em minha infância da alma, eu considerava eterno.
;o)))
Jamas li palavras tão maravilhosas,num texto esplendoroso!
Virei sua fã Carla Dias!
bejocas
Belisa... Sem palavras estou eu diante das suas palavras. Obrigada! De coração...
Eduardo... Que bom ter sua companhia nesses meus juramentos.