O DIA EM QUE BLUE ANNE PRECISOU DE AJUDA 2a parte >> Zoraya Cesar

 


Resumo e link da primeira parte. Blue Anne chegara àquela parte da vida em que não procurava mais trabalho. Os negócios é que iam até dela – que os aceitava ou não. E agora? O que faria com a proposta que acabara de chegar?


Conhecendo o Cão e pensando que era manso

Tudo é perdoável quando se é jovem. E Blue Anne estava apenas começando a viver, a aprender seu ofício. E a amar. Serverin era pouco mais novo que ela, mas já experiente, aluno-monitor dos mais promissores. Bonito? Não. Mas, magro e ágil, exalava testosterona sob a aparência de um gentil nerd de óculos. Bem apessoado, educado. Como não cair de amores?

(Tudo é perdoável quando se é jovem. Inclusive não reconhecer um predador quando se encontra um.)

Blue Anne cresceu rápido na profissão, juntamente com Serverin. A rainha das estratégias e das mortes limpas. O rei das emboscadas e das mortes violentas.

Foram dois anos maravilhosos. Serverin era romântico; o sexo, intenso; o trabalho propiciava viagens ao redor do mundo. Jantares à luz de velas, vigílias enregelantes, caminhadas por cidades escaldantes, disfarces desconfortáveis, noites em claro planejando o próximo trabalho – seria facada? Tiro? Veneno? Emboscada? Explosão? As múltiplas maneiras de matar eram estudadas até decidirem o melhor método. E toda discussão sobre a forma de matar o alvo terminava em sexo selvagem.

Blue Anne estava feliz. Dinheiro entrando. Amor com sua alma gêmea. Realização profissional. Viagens. Era jovem. A vida era boa.

Qual faca entra mais afiada em um coração? A da traição?

Blue Anne estava posicionada em um telhado, o rifle de longa distância e alta precisão preparado. O alvo, um alto executivo imiscuído em tráfico de armas, chegaria ao escritório a qualquer momento. Blue Anne sempre estava a postos horas antes do evento. Nunca perdera por esperar.

Exceto aquele dia.

Um dia de sol vermelho, ar quente e seco, o mundo parecia parado. Blue Anne tinha de lubrificar os olhos de tempos em tempos. Engolia pílulas hidratantes, para não ocupar as mãos nem ter vontade de ir ao banheiro. De vez em quando mudava de posição e fazia alguns movimentos para não ficar com o corpo dormente, sem nunca perder de vista o ambiente no qual o alvo seria abatido.

No entanto, começava a se preocupar. O horário previsto estava estourando e nada. Seus instintos e treinamento gritaram. E foi então que resolveu, repentinamente, que deveria abortar a missão e estudar um novo dia. Ia ser divertido planejar tudo de novo nos braços de Serverin.

Uma bala tirou lascas de cimento no lugar onde o corpo de Blue Anne estava segundos antes. A assassina não perdeu tempo, correu agachada em zigue-zague, colocando-se atrás de uma pilastra, as balas zunindo em seu encalço. Na adrenalina, veio-lhe um pensamento estranho ‘eu não teria errado’.

A maleta com o rifle ficara para trás. Ela tinha de pegá-la, mas como? Não teve tempo de planejar, a porta que dava para o terraço abriu e um homem de camiseta de malha, calças de moletom e óculos escuros entrou, olhando em volta, procurando... por quem? Por ela? Parecia uma pessoa normal, e que Deus a livrasse de matar um inocente! Ou um agente da lei, pior ainda.

Mas o que uma pessoa normal fazia ali àquela hora quentíssima do dia? E porque o atirador parara de atirar?

O sujeito chegou perto da mala, viu que o rifle não estava lá, e acenou para o prédio vizinho, do qual um outro homem levantou e acenou também. Blue Anne não teve mais dúvidas. Atirou primeiro no homem do telhado, que caiu para trás. E no homem que procurava por ela.  

De repente, ela baqueou e grunhiu. Finalmente a bala que a atingira mostrava sua presença. Nunca havia levado um tiro. Que dor! Que dor! Teve vontade de gritar até os pulmões saírem para fora. Mas em vez disso foi verificar se o homem realmente estava morto e se tinha alguma documentação ou celular – nada. Ainda agachada, pegou sua maleta e, engruvinhando a roupa sobre o ferimento – sorte que fora de raspão – escapou pela saída de emergência que resolvera mudar em cima da hora, contrariando seu plano inicial.

Precisava chegar ao apartamento antes de desmaiar, encontrar Serverin e dizer que possivelmente tenham sido traídos, pois não havia como o alvo descobrir seus planos. Ela não usava o celular em missão.

Muitos anos se passaram e Blue Anne ainda não consegue entender como chegou e mais, sem chamar atenção.

Subiu, já quase desfalecendo, chorando de dor. No entanto, já estava serena o suficiente para pensar melhor. Deixou a mala do lado de fora da porta e pegou sua arma. Talvez devesse ter ido direto ao hospital da agência, pois  eles se encarregariam de salvar Serverin, se fosse o caso. Veio à sua mente a voz de seu instrutor: quando em perigo, primeiro salve-se, depois pense nos outros. Mas, e se Serverin estivesse sendo torturado, sequestrado, morto? Era o amor de sua vida!  

Entrou.

E, do nada, seu corpo ficou anestesiado. 

O apartamento estava vazio. Não havia uma só muda de roupa de Serverin. Em cima da mesa, os planos que fizeram juntos para cumprir o serviço. O mundo de Blue Anne desabou ali e, de certa forma, nunca mais foi o mesmo. Compreendeu tudo num átimo. O que ela nunca pôde entender é por que ele a entregara por dinheiro. E ainda por cima, por dinheiro sujo de sangue?

Ela podia ter morrido! Aliás, percebeu, essa era a ideia. Provavelmente, se não tivesse escolhido uma saída de última hora, estaria morta.

Ligou para a agência. Relatou o caso, pediu socorro. E o resto ficou para trás. A vergonha, os maus momentos e a recuperação da credibilidde dentro da corporação, a volta do equilíbrio, a cura.

O tempo passa, as cicatrizes permanecem

E agora, passados tantos anos, eis que aparece um contrato para matar um industrial cuja segurança era feita por quem? Serverin. Conhecido internacionalmente por sua proficiência em proteger e matar. E em sobreviver.

Blue Anne pestanejou. Hesitou. Remoeu.

E resolveu que precisava de ajuda.

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Condessa Diana Alle D'Olblac, por sua vez, não pestanejou, não hesitou, não remoeu. Foi direto ao ponto, cinicamente, como era seu feitio.

- Você vai aceitar esse trabalho, ganhar muito dinheiro e acabar com essa história de uma vez por todas. – Ela acentuou a palavra ‘história’, dando-lhe outros entendimentos.

Blue Anne, uma vez tomada a decisão, também não era mulher de vacilar.

- Tem razão. Até porque se ele souber que fui sondada, virá atrás de mim. Mas vou chamar o Aindrius. Preciso da mente sinuosa daquele sátiro inveterado. Já tenho uma vaga ideia de como vamos matar dois coelhos com uma só cajadada.

A Condessa sorriu  e se espreguiçou, lânguida, em sua chaise longue, como um gato afiando as garras. Se havia uma coisa que ela gostava era ajudar uma amiga. Se a amiga fosse Blue Anne, e envolvesse ação e trabalhar com Aindrius, então, era o paraíso. Como duvidasse que qualquer dos três fosse para o paraíso depois de mortos, era bom aproveitar naquela vida mesmo.

O amigo bioquímico amigo, especialista de inventar novas fórmulas de morte, entorpecimento e qualquer coisa ilegal, rei dos fármacos na Dark Web, e que nunca transava com menos de duas mulheres ao mesmo tempo, atendeu o telefone resmungando.

- Bluesey, só atendi porque era você e porque aquela vaca da Diana já deixou cinco recados. Estou com uma astrofísica e uma engenheira aeroespacial me esperando para lançarmos meu foguete no espaço, preparei uma bebida especial para nós e...

Blue Anne o interrompeu. Quando Aindrius começava a se entusiasmar em contar seus planos sexuais ele só parava quando contava os detalhes e aí desligava abruptamente e só retornava ao mundo um ou dois dias depois. Blue Anne, Bluesey, não tinha esse tempo. Ele silenciou e ouviu. Ela foi rápida.

- Tô dentro. Além do que vou fazer agora, nada me daria mais prazer. Ganhar dinheiro em cima daquele filho da puta degenerado é sonho de consumo.

(Tanto quanto Diana, Aindrius também tinha rígidos códigos de conduta quando se tratava de palavra dada e amigos. A traição de Serverin era indesculpável. E ponto final).

Continua a 3ª e última parte dia 18 de julho, na qual veremos como termina a história de Blue Anne e seus amigos.

 O dia em que Blue Anne precisou de ajuda - 1a parte

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Não pechincharás, não desprezarás mulheres de aparência frágil - 1a parte

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Comentários

Marcio disse…
Essa agência está muito ABIN.
Tem hospital, help desk, plano de carreira...
Mais um pouco, e a associação de funcionários vai divulgar folders dos clubes de Muriqui e de Piraí (tem para todos os gostos: praia e serra).

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