EQUILIBRISTA >> JANDER MINESSO

 

Pessoas de todos os cantos vinham até o circo para ver o equilibrista. Ninguém ouvira uma palavra sobre ele antes da sua estreia no picadeiro. O diretor precisava de um equilibrista e o homem disse que sabia fazer o trabalho. Assim, fecharam contrato.

Na primeira noite, ele mirou o chão durante toda a subida. Já no alto da plataforma, secou as palmas das mãos no maiô. Então, pôs-se a fazer o que precisava ser feito ao longo daquele fiapo de caminho. Pé ante pé, cobriu com folga mais de metade da distância. Não tinha pressa de respirar. Pé esquerdo na frente. Inspiração. Expiração. Pé direito na frente.

A poucos metros da plataforma final, colocou um pé adiante antes de expirar. Tentou voltar o passo no meio do caminho e o fio que era chão tremeu. O coração descompassou, fez menção de implodir, irradiando calor das costas até atrás dos joelhos. A corda era um mar bravo na tempestade. Lá embaixo, as pessoas riram, depois se calaram. Sentiu uma última estilingada e, de repente, nada sob seus pés. Ele prendeu o fôlego e o mundo se apagou feito uma televisão de tubo.

Acordou mole, tracionado por cabos e atravessado por pinos. Foram meses até que se recuperasse a ponto de cogitar um novo ensaio. Ficou até surpreso por deixarem-no tentar, mas um equilibrista que cai uma vez ainda tem utilidade. E assim, subiu. Na segunda tentativa, os joelhos tremeram antes que chegasse na metade do percurso. Ainda conseguiu se agarrar à corda, mas as mãos suavam muito. Logo tudo ficou escuro e calmo de novo.

Descobriu que um equilibrista que cai muitas vezes também tem utilidade. Enquanto houvesse teimosia, haveria trabalho. O espetáculo era o retorno. Cada vez que subia a escada, os aplausos davam-lhe propósito. E apesar do corpo torto depois de tantas remontagens, ele sabia o que precisava fazer. Inspirava, expirava e colocava o pé direito adiante, rumo à inevitável queda.

Para ler outros textos do autor, clique aqui.
Imagem: Pixabay

Comentários

Postagens mais visitadas