INCÊNDIO À DEZESSETE MÃOS >> Cristiana Moura e Outros
Quando eu era menina, em infância remota lá em São Paulo, quase pus fogo no prédio. Queria mesmo, e nem sabia, era queimar a vida, um punhado de emoções e transmutar — fazer uma novinha em folha. Nem sabia...
E mesmo com a vida nova e muitas mudanças, uma dor acompanha e sufoca, no entanto, ao redor, há o cuidado, há o afeto daqueles que realmente se importam. Então não pus fogo no prédio porque tem quem se importa, quem me ama. Todavia havia o que queimar e incendiei aqueles sentimentos ruins que moravam dentro de mim e me tiravam o ar e como uma fênix eu ressurgi das cinzas.
Vida é coisa cíclica e disforme, coisa que faz e desfaz a cada passo. Passado e futuro não definem nem delimitam essa vida sendo vivida. Só o caminho pode configurar, passo a passo, um de cada vez, as nossas idas e vindas.E vou encontrando e reencontrando os traços dessa caminhada a medida que vou apreendendo a amar.
Com a natureza venho aprendendo a ser semente. Semente que brota, vive e chega ao fim. Talvez a vida seja mesmo isso e neste processo muitas histórias nos atravessam e são vividas. Os processos das nossas vidas humanas se equiparam aos da natureza e, até seu fim, temos mesmo é que passarinhar.
Olhando a menina que existe em mim, posso perceber que suas, minhas feridas ao serem cuidadas, tornaram-se ferramentas com as quais posso ajudar outras pessoas. É preciso aprender a servir. O serviço promove um caminho de cura sem igual. Minha menina vem se curando porque aprendeu a servir!
Eis que o fogo não vem só para destruir, mas também para transformar e purificar. Queimou? Talvez. E agora? Segue, segue e descobre a beleza de curar, mudar e seguir. Segue aprendendo, sonhando e se entregando a vida. A menina caminha em busca de entrega, transformação e ressignificação de sentimentos e emoções, conferindo sentido a tudo que fez, a todo o vivido. Ela sabe, agora, que tudo o que estava dentro, que sufocava, precisava ser extravasado, ser expresso.
Quantas árvores queimadas serão necessárias para perceber que a nossa própria carne que queima? Carne-menina, carne-mulher, carne-homem, carne-Deus. Eis assim a vida que segue. E o que afinal se leva da vida se não um ao outro?
* Este texto foi escrito, em total silêncio, por mim e pelos alunos do curso de ArteTerapia do Movimento de Saúde Mental Comunitária do Bom Jardim em Fortaleza. Em silêncio ouvimos uns aos outros. Escrevendo e ouvindo os silêncios e palavras escritas somos um.
- David Alencar
- Hanna Linhares
- Ton Almeida
- Laura Cristina Paiva
- João Paschoalick Neto
- Isabel Clotilde Rolim
- Renata Kely da Silva
- Dayana Souza dos Santos
- Ana Gabriela Garcia
- Ana Cláudia Venâncio
- Luiza Laura Serafim
- Marilac de Araújo Viana
- Flávia Roberta Sales
- Cláudia Macambira de Oliveira
- Anna Vanessa Ferreira
- Marlene Augusta de Carvalho
- Cristiana Moura
- David Alencar
- Hanna Linhares
- Ton Almeida
- Laura Cristina Paiva
- João Paschoalick Neto
- Isabel Clotilde Rolim
- Renata Kely da Silva
- Dayana Souza dos Santos
- Ana Gabriela Garcia
- Ana Cláudia Venâncio
- Luiza Laura Serafim
- Marilac de Araújo Viana
- Flávia Roberta Sales
- Cláudia Macambira de Oliveira
- Anna Vanessa Ferreira
- Marlene Augusta de Carvalho
- Cristiana Moura
Comentários
Que texto belíssimo e que trabalho de libertação incrível foram esses, Cris!
Geralmente tentamos nos libertar dos traumas pelo fortalecimento da auto-estima, o que é muito bom, mas essa é a primeira vez que vejo o instrumento ser o serviço ao outro. E quantas estradas novas isso abre em nossas vidas! Fiquei muito, muito emocionada. Parabéns.