DA LOUCURA - que nos espreita... [Debora Bottcher]
Minha mãe vive num condomínio em Campinas, aos pés de uma colina que abriga um Hospital Psiquiátrico. Eu morei por lá muitos anos - não no hospital, mas com meus pais, que fique claro.
Durante as tardes, nos finais de semana, os pacientes são liberados para um passeio livre e circulam pelas ruas de 'fronteira fechada'. Eles riem e brincam com as crianças e os animais; desenham na areia, conversam com as flores, sentam-se no gramado para admirar o por do sol, silenciosos e com indecifráveis fisionomias.
Muitas vezes, ao observá-los ocasionalmente, peguei-me questionando se os loucos são os que vivem internos ou os que caminham entre nós. Afinal, quem são os ensandecidos? Uma versão de pessoas como eu e você - talvez mais verdadeiras, corajosas, excêntricas e destemidas...
Vejamos: você se lembra daquela vez em que mentiu com prazer, de ter mudado uma situação, contando-a de outro jeito, sem arrepender-se? E de sentir seu coração transformando-se em gelo, magoando indiscriminada e intencionalmente, parecendo não se importar com a dor alheia?
E de quando desejou ser criança para sempre? Você se lembra de uma ocasião em que falaram com você e você fingiu não escutar? Lembra de quando, num gesto brusco e descontrolado, derrubou tudo o que tinha sobre a mesa e gritou, fazendo tremer um quarteirão?
Você se lembra de ter sentido vontade de perambular por aí - ou até ter feito isso! -, sem destino, sem rumo, sem pressa ou vontade de voltar? Lembra-se de querer apagar o seu passado? Você se lembra de ter desejado acabar com tudo, morrer, ainda que remotamente e só por um segundo? De ter olhado para um vidro de comprimido e a garrafa de vodka, ou sentado-se na beirada de uma varanda alta, de estar dirigindo e olhado um penhasco, e ter pensado, mesmo que só num susto: "E por que não?"...
Você se lembra de ter enterrado as unhas na palma das mãos até sangrar? Já quis atear fogo à sua volta? Já desejou matar alguém - ainda que em legítima defesa! -, sem sentir qualquer vestígio de culpa? Já deixou-se ficar na cama, trancada num quarto escuro por muitas horas, até dias, abandonada especialmente de si mesma? Já deitou-se no chão e ficou ali, chorando ou não, mas incapaz de levantar-se?
Você se lembra de já ter-se olhado no espelho e não saber quem te olhava de volta?
É... E, afinal, os loucos não somos nós...
Durante as tardes, nos finais de semana, os pacientes são liberados para um passeio livre e circulam pelas ruas de 'fronteira fechada'. Eles riem e brincam com as crianças e os animais; desenham na areia, conversam com as flores, sentam-se no gramado para admirar o por do sol, silenciosos e com indecifráveis fisionomias.
Muitas vezes, ao observá-los ocasionalmente, peguei-me questionando se os loucos são os que vivem internos ou os que caminham entre nós. Afinal, quem são os ensandecidos? Uma versão de pessoas como eu e você - talvez mais verdadeiras, corajosas, excêntricas e destemidas...
Vejamos: você se lembra daquela vez em que mentiu com prazer, de ter mudado uma situação, contando-a de outro jeito, sem arrepender-se? E de sentir seu coração transformando-se em gelo, magoando indiscriminada e intencionalmente, parecendo não se importar com a dor alheia?
E de quando desejou ser criança para sempre? Você se lembra de uma ocasião em que falaram com você e você fingiu não escutar? Lembra de quando, num gesto brusco e descontrolado, derrubou tudo o que tinha sobre a mesa e gritou, fazendo tremer um quarteirão?
Você se lembra de ter sentido vontade de perambular por aí - ou até ter feito isso! -, sem destino, sem rumo, sem pressa ou vontade de voltar? Lembra-se de querer apagar o seu passado? Você se lembra de ter desejado acabar com tudo, morrer, ainda que remotamente e só por um segundo? De ter olhado para um vidro de comprimido e a garrafa de vodka, ou sentado-se na beirada de uma varanda alta, de estar dirigindo e olhado um penhasco, e ter pensado, mesmo que só num susto: "E por que não?"...
Você se lembra de ter enterrado as unhas na palma das mãos até sangrar? Já quis atear fogo à sua volta? Já desejou matar alguém - ainda que em legítima defesa! -, sem sentir qualquer vestígio de culpa? Já deixou-se ficar na cama, trancada num quarto escuro por muitas horas, até dias, abandonada especialmente de si mesma? Já deitou-se no chão e ficou ali, chorando ou não, mas incapaz de levantar-se?
Você se lembra de já ter-se olhado no espelho e não saber quem te olhava de volta?
É... E, afinal, os loucos não somos nós...
Comentários
Zoraya, obrigada pelo carinho. Eu ando escrevendo pouco, mas quando o faço, é sempre uma alegria ser lida por pessoas como vcs. :)
Beijo.