EPIDEMIA DO EU >> SORAYA JORDÃO
Viajar em excursão é sempre uma aprendizagem para a vida seja porque nos obriga a desenvolver a tolerância, seja porque nos faz conhecer o limite da paciência e a dimensão da nossa antipatia.
Inicialmente, tudo se mostra harmônico, arejado, confortável. Como o primeiro dia de aula na nova escola, todos estão apreensivos com relação à aceitação do grupo, mas dispostos a interagir e a fazer novas amizades. Tudo parece perfeito até o primeiro passeio. É nessa etapa que os perfis começam a se apresentar. Independente do tipo de viagem, a composição costuma se repetir. Tem sempre o engraçado, o reservado, o puxa-saco do guia, o sem-noção, o interessado na história local, o consumidor inveterado, o antipático, o reclamão, o gente boa e o avulso. Quem nunca encontrou um exemplar da espécie “sem noção” na viagem? Ele atrasa o grupo, assume o passeio coletivo como privativo, não tem pressa, não respeita as orientações do guia e, para piorar, entra no ônibus com a cara de quem chegou adiantado.
É nessa hora que a minha tolerância se dissipa. Por que o sujeito se convence de que ele pode fazer o que quiser com o tempo e a programação do outro?
Por que esperamos o abusado às custas de comprometer o nosso cronograma?
Por que cultivamos a premiação dos atrasados?
Em palestras, cursos, seminários, isso também acontece. Muitos palestrantes aguardam que todos estejam presentes para iniciar. Com isso, quem se preparou para cumprir o combinado fica à espera de quem não se preocupa com esse item. O mesmo se dá quando o professor repete tudo que foi dito antes do retardatário chegar para que ele não perca nenhuma informação. Quem chegou na hora que ouça tudo novamente…
Não sou rígida com horário, defendo os cinco ou dez minutos de tolerância, afinal, imprevistos acontecem. Mas estou convencida de que a maioria dos problemas acontecem por erro de planejamento ou falta de preocupação. Eu, inclusive, tenho muita dificuldade para administrar o tempo. Por isso, quando viajo, redobro a atenção.
Antes que possamos pensar que a falta de noção é coisa de brasileiro, alerto: a falta de educação é uma epidemia mundial.
Volto ao Brasil com a impressão de que a humanidade abriu mão de qualquer noção de senso comum. Hoje somos uma massa de umbigos. Cada um criando as leis do seu território imaginário. É chocante e assustador. Torna-se cada vez mais difícil conviver com esse monte de Eus ensimesmados. Haja tolerância!
Ainda assim, viajar é uma vivência insubstituível. Acabo de pousar e já penso no próximo roteiro.
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