DNA DA ALMA >> Soraya Jordão


No minuto em que o elevador me levou do térreo ao quinto andar, li, no painel eletrônico, que os peixes estão desaprendendo as rotas migratórias, e a pesca é a possível responsável pelo fenômeno. Os peixes mais velhos são os escolhidos, e o ensinamento que deveriam transmitir para os mais jovens não acontece. 

É, no mínimo, curioso constatar que a natureza imita a vida e ainda ministra lições para o bem-viver. Nós também não estamos perdidos feito os peixes? Quantas vezes ignoramos os ensinamentos do passado, desqualificamos a experiência dos mais velhos por julgar ultrapassado, inapropriado ou sem razão de ser? Como consequência, caímos no universo raso do estéril aqui e agora. 

Perdemos o interesse, o gosto de contar e ouvir histórias sobre os nossos antepassados, seus desafios e feitos. 

A transmissão oral familiar, os “causos”, o dedo de prosa e a eternidade dos nossos morreu por homicídio doloso.  Ninguém mais dá atenção a isso. Glorificamos os “likes”, a ostentação virtual dos “influencers”, a ilusão de felicidade do vizinho. Mas o que sabemos sobre a origem da nossa família, sobre o nosso marco zero? 

Quem era seu bisavô? Como ele conheceu sua bisavó? Que narrativas assinam seu sobrenome?

Será que desaprendemos a rota migratória? Sabemos para onde voltar quando precisamos descansar, nos conectar com o que é genuíno em nós? 

É possível conhecer quem se é quando ignoramos a nascente que nos constitui? 

Quem é você na fila do pão da padaria da sua tataravó? 

Precisamos acordar para o fato de que o Presente é uma colcha que se borda com a linha do tempo. Quando olhamos para o passado, entendemos a trama, o ponto que forma o bordado. Sem isso, o futuro é apenas um emaranhado de fios soltos sem um ornamento bonito de se admirar.

Comentários

Nadia Coldebella disse…
Vivemos na sociedade do aqui e agora. Ngm nem se lembra do vídeo q compartilhou a dois minutos.
Ótimo texto, profunda reflexão!

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