COTEJANDO DEDÕES >> Sergio Geia


Deitei a coberta de lado, num solavanco, pus-me de pé. Foi quando senti. 

Poderia ser na cabeça, no ombro ou mesmo no estômago. 

Era no dedão. O dedão do pé direito. Doía. 

Essas dores aparecem do nada. Fui dormir às onze, nem me lembrava que tinha dedões. De manhã, ao me levantar, o latejar, como se o tivesse colidido com um pé de cama. 

Com dificuldade me dirigi ao banheiro. Liguei o chuveiro. Quem sabe água quente dê jeito. 

Não me acuse de acidentes noturnos. Uma mente maliciosa pode criar histórias. Durmo só. Mesmo que quisesse companhia, em tempos de pandemia? Só se for virtual, como live de Instagram. Não acredito que virtualmente se machuque um dedão. 

Como bom médico, resolvo fazer o exame clínico. Tiro os chinelos, submeto o grande dedo a minuciosa análise. 

Herança de meu pai, os dedões sempre me foram demasiadamente feios. Na verdade, não apenas eles, mas o pé inteiro. Ao lado do dedão, tenho um dedo encavalado. Assim, ele se torna menor que o dedão e menor também que o dedo do meio, um formato meio desconjuntado. 

Seria uma vantagem sobre os meus pares quando descobri que um primo fora dispensado do exército por ter pé chato. O meu é chato e feio. Dispensa certa. Não vou entrar em detalhes, uma borboleta passou aqui e me pediu silêncio — alguém vai dizer mosca. A verdade é que nem viram o meu pé. 

Mas como pé fica escondido dentro de meia e sapato, não foi motivo de traumas ao longo da vida. Tanto é que estou aqui, sem melindres, revelando a feiura. Se alguma companheira notou, não falou, de modo que meus pés nunca me causaram grande desconforto, a não ser ao levantar da cama, no primeiro pisão do dia. 

Mas voltemos aos dedões, é o que interessa. A tonalidade do que dói se mostra um pouco mais escura em relação à cor do outro. Discreto tom rosáceo na lateral pode ser percebido. Unha? Talvez encravada? Aparentemente se mostra bem cortada. Será que espetou? 

Nunca sofri de tal mal. Sempre fui o meu cortador. Talvez corte bem. Tio Marcos sofre horrores. Avalio, apalpo (dói), cotejo, e não chego a lugar nenhum, como era de se esperar de um pseudomédico. 

Encurtando a história. No fim da noite deitei-me como na anterior, sem dor. Ela foi embora, como uma borboleta que entrou pela sacada, borboleteou pela casa, depois seguiu seu rumo sem eu perceber.

Comentários

Anônimo disse…
Faltou a foto do pé. Despertou curiosidade.
sergio geia disse…
Ai, ai, aí é difícil amigo (a) rsrs
Francisco fatima disse…
Concordo faltou a foto do dedão. Fiquei curiosa. Mas adorei a crônica.
Zoraya Cesar disse…
hahaha, Sergio, nossas dores e seus mistérios. Eu ri. Desculpe ser desalmada.
sergio geia disse…
É pra ri mesmo, Zoraya, pode acreditar que eu também dou boas gargalhadas com a leitura kkkkkkkkk.

E amigos queridos, nada de dedões e pés okay?

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