QUEM >> Carla Dias


Conheci quem economizasse na satisfação. Havia charme na contenção do frenesi ensaiado. Era um pelo arrepiando fora de hora sendo educado pela elegância severa, um gesto que fugia da contingência e se mostrava estrambótico, a palavra escorregando na voz para morrer em um silêncio afogado num gole d’água... com gás.

Tudo gritava economia de reter extravagância. A exuberância morava na diplomacia encenada, no tamborilar nos móveis que nunca teve, arrastar mãos em paredes pelas quais jamais permitiria o corpo escorregar, caminhar pelas ruas que nunca se ofereceriam para ocupar cargo de seu endereço residencial.

Era de insinuar reticências, e isso sempre incomodava. A cada respirar demorado, parecia executar uma sinfonia de si, colocando a companhia em modo de espera, voltada para a contemplação do que desejava que fosse visto na sua presença. Todo o resto dormia morno dentro dele.  

No fundo, mas bem no fundo do profundo escambau da insanidade, quem era de economizar na satisfação por pura satisfação. Orgulhava-se de controlar caminhos, de surrupiar lealdade de momentos de distração alheios. Deliciava-se ao extirpar a pele de verdades omitidas, deixando-as em carne viva, expostas em uma galeria de clichês que adorava decorar só para poder esquecer, daqui a pouco.


carladias.com.br


Comentários

Jander Minesso disse…
Eu seria mais um incomodado com esse insinuador de reticências. Ainda mais um insinuador que esfola verdades.
Nadia Coldebella disse…
Quem era alguém, afinal...
Zoraya Cesar disse…
"profundo escambau da insanidade," Gostei muito disso. Fiquei com pena da pessoa. Vivendo uma vida mínima por opção. Triste.
Albir disse…
Essa economia e contenção da felicidade acaba sendo contenção dos afetos também. Limita a convivência e é desonesto nas trocas, recebe mais que entrega.

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